13/10/2014

O Grande Amigo, que nunca atraiçoa

Procuras a companhia de amigos que, com a sua conversa e o seu afecto, com o seu convívio, te tornam mais tolerável o desterro deste mundo..., embora os amigos às vezes atraiçoem. – Não me parece mal. Mas... como é possível que não frequentes cada dia com maior intensidade a companhia, a conversa com o Grande Amigo, que nunca atraiçoa? (Caminho, 88)

A nossa vida é de Deus. Temos de gastá-la ao seu serviço, preocupando-nos generosamente com as almas e demonstrando, com a palavra e com o exemplo, a profundidade das exigências cristãs.

Jesus espera que alimentemos o desejo de adquirir essa ciência, para nos repetir: se alguém tem sede, venha a Mim e beba. E respondemos: ensina-nos a esquecermo-nos de nós mesmos, para pensarmos em Ti e em todas as almas. Deste modo, o Senhor far-nos-á progredir com a sua graça, como quando começávamos a escrever (lembrais-vos daqueles traços que fazíamos, guiados pela mão do professor?) e assim começaremos a saborear a dita de manifestar a nossa fé, que é já de si outra dádiva de Deus, também com traços inequívocos de uma conduta cristã, onde todos possam descobrir as maravilhas divinas.

É Amigo, o Amigo: vos autem dixi amicos, diz-nos Ele. Chama-nos amigos e foi Ele quem deu o primeiro passo, pois amou-nos primeiro. Contudo, não impõe o seu carinho: oferece-o. E prova-o com o sinal mais evidente da amizade: ninguém tem maior amor que o daquele que dá a vida pelos seus amigos. Era amigo de Lázaro e chorou por ele quando o viu morto. E ressuscitou-o. Por isso, se nos vir frios, desalentados, talvez com a rigidez de uma vida interior que se está a extinguir, o seu pranto será vida para nós: Eu te ordeno, meu amigo, levanta-te e anda, deixa essa vida mesquinha, que não é vida! (Cristo que passa, 93)


Ciência



O Dom de Ciência é um dom contemplativo cujo olhar penetra, como o dom de inteligência e o de sabedoria, no próprio mistério de Deus.





(m. m. philiponLos dones del Espíritu Santo, Palabra, Madrid 1983, pg. 200, trad ama)

Tratado da Graça 42

Questão 114: Do mérito, que é efeito da graça cooperante.

Art. 8 – Se o homem pode merecer o aumento da graça ou da caridade.

(II Sent., dist. XXVII, a. 5, In Ioan., cap. X, lect. IV).

O oitavo discute-se assim. – Parece que o homem não pode merecer o aumento da graça ou da caridade.

1. – Pois, a quem já recebeu o prémio merecido nenhuma outra recompensa é devida, como aqueles de quem diz a Escritura: Receberam a sua recompensa. Se pois pudéssemos merecer o aumento de caridade ou de graça, resultaria que, uma vez aumentada a graça, não poderíamos esperar mais nenhum prémio, o que é inadmissível.

2. Demais. – Nenhum ser pode agir além dos limites de acção da sua espécie. Ora, o princípio do mérito é a graça ou a caridade, como do sobredito resulta. Logo, ninguém pode merecer graça ou caridade maior que a que tem.

3. Demais. – O que o homem pode merecer merece-o por algum acto procedente da graça ou da caridade, assim como pode merecer a vida eterna por qualquer acto praticado nessas condições. Se pois, o aumento da graça ou da caridade pode ser merecido, resulta que merecemos esse aumento por qualquer acto informado pela caridade. Ora, o que merecemos, recebemos infalivelmente de Deus, se não sobrevier o obstáculo do pecado, conforme a Escritura: Sei a quem tenho crido, e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito para aquele dia. Donde se seguiria que, por qualquer acto meritório, a graça ou a caridade ficaria aumentada. Ora, isto é inadmissível porque às vezes esses actos meritórios não são praticados com muito fervor, de modo a bastarem para causar o aumento da caridade. Logo, o aumento da caridade não pode ser merecido.

Mas, em contrário, diz Agostinho: a caridade merece ser aumentada, para que, aumentada, mereça chegar à perfeição. Logo, o aumento da caridade ou da graça pode ser merecido.

Como já dissemos, pode ser merecido condignamente aquilo a que se estende a moção da graça. Ora, a moção de um motor não se estende só ao último termo do movimento, mas também a todo o seu desenvolvimento progressivo. Ora, o termo do movimento da graça é a vida eterna. E o avanço progressivo desse movimento depende do aumento da caridade ou da graça, conforme a Escritura: A vereda dos justos, como luz que resplandece, vai adiante e cresce até o dia perfeito, que é o dia da glória. Logo, o aumento da graça pode ser merecido.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. – O prémio é o termo do mérito. Ora, o movimento tem duplo termo: o último e o médio, que constitui ao mesmo tempo um princípio e um termo. A recompensa, consistente no aumento, é um termo desta espécie. Pelo contrário, a recompensa consistente no favor dos homens é como o último termo para os que o consideram como fim. Por isso, esses não receberão nenhuma outra recompensa.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O aumento da graça não sobreleva o poder da graça preexistente, embora lhe ultrapasse a grandeza. Assim como uma árvore, de tamanho muito superior à da sua semente, não lhe excede, contudo, a virtude.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Por qualquer acto meritório o homem merece o aumento da graça, bem como a sua consumação, que é a vida eterna. Mas, como esta não é concedida imediatamente, mas em tempo oportuno, assim também a graça não aumenta imediatamente, mas no seu tempo, isto é, quando o sujeito estiver suficientemente disposto a lhe receber o aumento.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


Evangelho diário, coment. e leit espiritual (Enc. Octobri mense Leão XIII)

Tempo comum XXIII Semana

Evangelho: Lc 11, 29, 33-22

29 Concorrendo as multidões, começou a dizer: «Esta geração é uma geração perversa; pede um sinal, mas não lhe será dado outro sinal, senão o sinal do profeta Jonas. 30 Porque, assim como Jonas foi sinal para os ninivitas, assim o Filho do Homem será um sinal para esta geração. 31 A rainha do meio-dia levantar-se-á no dia do juízo contra os homens desta geração, e condená-los-á, porque veio dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão; e aqui está Quem é mais do que Salomão. 32 Os ninivitas levantar-se-ão no dia do juízo contra esta geração, e condená-la-ão, porque fizeram penitência com a pregação de Jonas; e aqui está Quem é mais do que Jonas!

Comentário:

Estas afirmações do Senhor são actuais?

Encontraremos a resposta dentro do nosso coração: A nossa atitude perante a vida, a sociedade, nós próprios é coerente com a condição de Filhos de Deus?

Para seguir Cristo levantamos questões, temos dúvidas, falta-nos Confiança, Esperança e, sobretudo, Fé?

(ama, comentário sobre Lc, 11, 29 - 32, 2014.02.12)

Leitura espiritual


Documentos do Magistério
CARTA ENCÍCLICA
OCTOBRI MENSE
DE SUA SANTIDADE
PAPA LEÃO XIII
A TODOS OS NOSSOS VENERÁVEIS
IRMÃOS, OS PATRIARCAS,
PRIMAZES, ARCEBISPOS
E BISPOS DO ORBE CATÓLICO,
EM GRAÇA E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA

SOBRE O ROSÁRIO DE NOSSA SENHORA

Excelência do Rosário

17. Ora, como quer que, entre as diversas formas e maneiras de honrar a divina Mãe, são de preferir aquelas que por si mesmas são julgadas mais excelentes e a ela mais agradáveis, apraz-nos expressamente apontar e vivamente recomendar o santo Rosário. A este modo de orar foi dado, na linguagem comum, o nome de "coroa", porque ela também recorda, num feliz enredo, os grandes mistérios de Jesus e de Maria: as suas alegrias, as suas dores e os seus triunfos. Se os fiéis meditarem e contemplarem devotamente, na ordem, devida, estes augustos mistérios, haurirão deles um admirável auxílio, quer em alimentar a sua fé e em preservá-la da ignorância e do contágio dos erros, quer em elevar e fortalecer o vigor do seu espírito.

Com feito, por esse modo o pensamento e a memória de quem reza, são, à luz da fé, atraídos com suavíssimo ardor para estes mistérios. Neles concentrados e imersos, nunca se cansarão de admirar a obra inenarrável da Redenção humana, levada a efeito por tão caro preço e com uma sucessão de tão grandes acontecimentos. E, diante destas provas da divina caridade, a alma inflamar-se-á de amor e de gratidão, consolidará e aumentará a sua esperança, e avidamente visará a recompensa celeste, preparada por Cristo para aqueles que se Lhe houverem unido pela imitação dos seus exemplos e pela participação das suas dores. E, enquanto isso, com os lábios se pronunciam as orações ensinadas pelo próprio Cristo, pelo Arcanjo Gabriel e pela Igreja. Orações tão cheias de louvores e de salutares aspirações não poderão ser repetidas e continuadas, na sua vária e determinada ordem, sem produzirem sempre novos e suaves frutos de piedade.

Origem e glórias do Rosário

18. Que, pois, a própria Rainha do Céu haja ligado a esta oração uma grande eficácia, demonstra-o o facto de ela haver sido instituída e propagada pelo ínclito S. Domingos, por impulso e inspiração dela, em tempos especialmente tristes para a causa católica, e bem pouco diferentes dos nossos, e instituída como um instrumento de guerra eficacíssimo para combater os inimigos da fé.

19. Com efeito, a seita herética dos Albigenses, ora sorrateira, ora abertamente, invadira numerosas regiões, espantosa descendência dos Maniqueus ela repetia os monstruosos erros destes, e renovava as suas hostilidades, as suas violências e o seu ódio profundo contra a Igreja. Contra essa turba tão perniciosa e arrogante, já agora pouco ou nada se podia contar com os auxílios humanos, quando o socorro veio manifestamente de Deus, por meio do Rosário de Maria.

Assim, graças à Virgem, gloriosa e debeladora de todas as heresias, as forças dos ímpios foram abatidas e quebradas, e a fé de muitíssimos ficou salva e intacta. E pode dizer-se que semelhantes factos se verificaram no seio de todos os povos. Quantos perigos conjurados! Quantos benefícios alcançados! A história antiga e moderna aí está para o demonstrar com os mais luminosos testemunhos.

Difusão e vitalidade do Rosário

20. Porém outra prova evidente também nos é fornecida pelo facto de, apenas instituída a oração do Rosário, a sua prática em brevíssimo tempo se ter propagado por toda parte, entre toda classe de pessoas. E, com feito, se é verdade que o povo cristão tem achado diversas formas e títulos insignes para honrar a Mãe de Deus, que sozinha se eleva, entre todas as criaturas, por tantas excelsas prerrogativas, todavia é inegável que os fiéis sempre amaram de modo todo particular o título do Rosário: isto é, essa maneira de orar que é considerada como a senha da nossa fé e o compêndio do culto a ela devido.

E têm-na praticado particularmente e em público, no interior das casas e no seio das famílias, instituindo confrarias, consagrando altares, promovendo solenes procissões, convencidos de que de nenhum outro modo poderiam melhor honrar as suas festas e merecer o seu patrocínio e as suas graças.

21. Nem passe em silêncio um facto que focaliza uma particular providência de Nossa Senhora acerca do Rosário. E é este. Quando, com o correr do tempo, no seio de algum povo pareceu enfraquecer-se o gosto pela piedade, e relaxar-se também a prática desta oração, mal se desenhou, pelo lado do Estado, algum gravíssimo perigo, ou se apresentou qualquer necessidade pública, por voto unânime foi a prática do Rosário, de preferência a outras manifestações religiosas, que foi como que por encanto revocada a uso e recolocada no seu lugar de honra, com geral benefício. E desta asserção não se faz mister ir buscar as provas no passado, porque, temos ao alcance da mão, uma insigne nos nossos dias.

Como dissemos desde o princípio, estes nossos tempos são cheios de amargura para a Igreja de Deus, e ainda mais para Nós, chamado pela Providência Divina a governá-la. Ora, justamente nestes tempos é que nos é dado notar e admirar, em toda parte do orbe católico, um fervoroso despertar na prática e na devoção do Rosário. E, visto que este facto, antes que à diligência humana, se deve efectivamente atribuir a Deus, que dirige e conduz os homens, isto consola, e levanta o Nosso ânimo, enchendo-o de grande confiança em que, pela intercessão de Maria, a Igreja poderá alcançar novos e mais extensos triunfos.

Como se deve orar

22. Há alguns que creem as coisas que relembramos, mas, depois, vendo não ter sido ainda alcançado nada daquilo que se esperava - e em primeiro lugar a paz e a tranquilidade da Igreja, antes, vendo a situação tornar-se sempre mais ameaçadora, como que cansados e desconfiados diminuem a assiduidade e o ardor da sua oração. Mas estes deveriam, em primeiro lugar, reflectir, e fazer com que as orações por eles dirigidas a Deus sejam dotadas dos requisitos que, segundo o preceito de Cristo Senhor Nosso, são necessários.

E, depois, se as suas orações fossem realmente assim, deveriam além disso considerar que é coisa indigna e culposa o querer fixar a Deus o momento e o modo de vir em nosso socorro, a Deus que não nos deve nada, tanto que, quando Ele atende a quem lhe ora, e quando "coroa os nossos méritos, na realidade não coroa outra coisa senão os seus próprios dons" (S. Agostinho, Epistola 194 al. 105 ad Sixtum, c. 5, n. 19), e, quando não secunda os nossos desejos, comporta-se providencialmente como um bom pai para com seus filhos, o qual tem piedade da estultícia destes, e olha sempre à sua verdadeira utilidade.

A oração pela Igreja e a oração da Igreja

23. Mas Deus acolhe benignamente e atende as orações que amparadas pela intercessão dos Santos, lhe erguemos devotamente para torná-lo propício à sua Igreja, seja quando para a sua Igreja pedimos os bens mais altos e eternos, seja quando pedimos bens importantes e temporais, mas, em todo caso, úteis àqueles. Com efeito, a tais orações adita valor e imensa eficácia, com as suas orações e os seus méritos, Nosso Senhor Jesus Cristo, que "amou a Igreja e deu-se a si mesmo por ela, com o fim de santificá-la... para fazer aparecer diante de Si mesmo, gloriosa, a Igreja" (Ef 5, 25-27), Ele que é seu Pontífice supremo, santo, inocente, "sempre estando vivo, para poder interceder por nós", Ele que, nas suas orações e súplicas - cremo-lo por fé divina - sempre consegue o seu intento.

24. Portanto, no que diz respeito aos interesses da Igreja, é sabido que as mais das vezes ela deve lutar com adversários formidáveis por ódio e poder, e sobejas vezes deve doer-se de que pelos seus inimigos lhe sejam arrancados os seus bens, limitada e oprimida a sua liberdade, atacada e desprezada a sua autoridade, e, em suma, infligidos danos e violências de todo género.

E, se nos perguntarem por que razão a maldade destes não chega ao cúmulo de injustiça que eles se propõem e se esforçam por atingir, e, de outra parte, porque razão a Igreja, mesmo no meio de tantas vicissitudes, refulge sempre, conquanto de modos diversos, da mesma grandeza e da mesma glória, e continua a progredir, justo é atribuir à verdadeira causa de um e de outro facto ao poder da oração unânime da Igreja, não podendo humanamente explicar-se como a iniquidade, mesmo tão descarada, seja contida dentro de limites tão estreitos ao passo que a Igreja, embora mantida em opressão, alcança sem embargo, tão esplêndidos triunfos.

E isto aparece ainda mais evidente no campo desses bens de que a Igreja se serve para conduzir os homens à posse do bem supremo. Visto haver ela nascido justamente para esta missão, a sua oração deve ter uma grande eficácia em obter que se cumpra perfeitamente sobre os homens o desígnio da providência e misericórdia de Deus, de modo que, quando os homens oram com a Igreja e por meio da Igreja, em definitivo impetram e obtêm aquilo que "desde a eternidade Deus onipotente dispusera conceder" (S. Tomás, II-II, q. 83, a. 2: de S. Greg. Magno).

Os milagres da oração

25. Neste mundo a mente humana falha em face dos excelsos planos da Divina Providência, mas dia virá em que o próprio Deus, na sua grande bondade, nos manifestará as causas e o enredo dos acontecimentos, e então aparecerá claramente que poderosa eficácia de impetração teve nesta ordem de coisas o dever da oração.

Então ver-se-á que foi justamente por virtude da oração que muitos, mesmo em meio à grande corrupção do mundo depravado, se conservaram puros e isentos "de toda contaminação de carne e de espírito, realizando a santificação no temor de Deus" (2 Cor, 7, 1), que outros, quando estavam a ponto de ceder ao mal, não somente se contiveram, mas do perigo e da tentação tiraram um acréscimo de virtude, que outros, já derrubados, por um estímulo interior foram impelidos a levantar-se e a lançar-se no amplexo de Deus misericordioso.

26. Por isto Nós conjuramos todos a quererem meditar atentamente estas verdades, a não se deixarem seduzir pelos ardis do antigo inimigo, a nunca abandonarem, por motivo algum, a prática da oração, antes os exortamos a perseverarem nela, sem nunca se cansarem. E, em primeiro lugar, lembrem-se de implorar o mais alto de todos os bens: a salvação eterna de todos, e a incolumidade da Igreja. Depois disto poderão invocar de Deus os outros bens que concernem à prosperidade temporal, contanto que sejam resignados à sua justíssima vontade, e que, atendidos ou não nas suas orações, saibam render-Lhe graças como ao mais benfazejo dos pais.

Por último, recomendamos-lhes orarem com esse espírito de religião e de piedade que sempre convém quando se trata com Deus: como costumavam fazer os Santos, e como fazia o nosso próprio Redentor e Mestre, "com fortes gritos e lágrimas" (Heb 5, 7).

Com a oração, a mortificação

27. Neste momento, a dor e o afecto de Pai impele-nos a implorar de Deus, dador de todos os bens, para todos os filhos da Igreja, não somente o espírito da oração, mas também o da mortificação. Fazendo isto de todo coração, Nós exortamos todos, com a mesma solicitude, a praticarem esta virtude, tão estreitamente unida à outra.

Porquanto, se a oração conforta a alma, robustece-a e eleva-a às coisas celestes, a mortificação habitua-nos a dominar-nos a nós mesmos, e especialmente o corpo, que, por motivo de antiga culpa, é o mais perigoso inimigo da razão e da lei evangélica. Há entre estas virtudes - como é evidente um nexo indissolúvel. Elas ajudam-se reciprocamente, e juntas tendem ao mesmo fim, que é o de desapegar o homem, nascido para o Céu, das coisas caducas deste mundo, para elevá-lo quase a uma celeste intimidade com Deus. Ao contrário, aquele que tem o ânimo aceso pelas paixões e amolecido pelos prazeres tem náusea das alegrias celestes, que nunca experimentou. A sua oração não passa de uma voz fria e lânguida, certamente indigna de ser escutada por Deus.

O exemplo dos santos

28. Temos sob os olhos os exemplos de mortificação deixados pelos Santos. Pois bem: era justamente esse espírito de mortificação que tornava aceites por Deus as suas orações, tanto que, como nos atesta a história sagrada, eles tiveram até mesmo o poder de operar milagres. Esses Santos eram assíduos em regular e refrear a mente, o coração e as paixões, submetiam-se sempre com grande docilidade e humildade à doutrina de Cristo, aos ensinamentos e aos preceitos da sua Igreja, nada queriam, nada recusavam, sem antes haver sondado a vontade de Deus, nas suas acções não se propunham outro escopo senão a maior glória de Deus, continham e reprimiam energicamente os apetites da carne, tratavam o próprio corpo duramente e sem piedade, e, por amor da virtude, abstinham-se até mesmo das coisas por si mesmas lícitas. Assim podiam com razão aplicar a si mesmos as palavras que o Apóstolo Paulo dizia de si: "já que a nossa cidadania é nos céus" (Filip 3, 20), e, pela mesma razão, as suas orações eram tão eficazes em lhe tornar Deus propício e benigno.

Necessidades da penitência

29. Certamente, nem a todos é dada a possibilidade, nem todos têm a obrigação de fazer o mesmo, mas cada um é obrigado, segundo o seu poder, a mortificar a sua vida e os seus costumes. Exige-o a justiça divina, à qual é dada estrita satisfação das culpas cometidas, e é preferível dar essa satisfação enquanto se está em vida, com penitências voluntárias, porque assim também se tem o mérito da virtude.

Além disto, já que nós todos estamos unidos e vivemos no corpo místico de Cristo, que é a Igreja, daí se segue, consoante S. Paulo, que, tal como os gozos, assim também as dores de um membro são comuns a todos os outros membros: quer dizer que os irmãos cristãos devem vir voluntariamente em auxílio dos outros irmãos nas suas enfermidades espirituais ou corporais, e, na medida em que estiver em seu poder, cuidar da sua cura, "os membros tenham a mesma solicitude uns com os outros, e, se um membro sofre, sofrem com ele todos os membros, ou, se um membro tem glória, todos os membros se regozijam com ele.

Ora, vós sois corpo de Cristo, e sois particularmente membros deste" (1 Cor 12,25-27). Nesta prova que a caridade nos pede, de expiarmos as culpas de outrem, a exemplo de Jesus Cristo, que com imenso amor deu a sua vida para redimir todos do pecado, está esse grande vínculo de perfeição que une estreitamente os fiéis entre si, com os Santos e com Deus.

30. Em suma, o espírito da santa mortificação é tão vário, industrioso e extenso, que qualquer um desde que animado de piedade e de boa vontade pode praticá-lo com muita frequência e sem esforço excessivo.

Exortações e esperanças

31. Depois do que até aqui expusemos, não nos resta, Veneráveis Irmãos, senão esperar dos Nossos avisos e das Nossas exortações o êxito mais consolador. E de facto o esperamos da vossa singular e profunda piedade para com a augusta Mãe de Deus, da vossa solicitude e do vosso zelo pelo rebanho a vós confiado. E já a nossa alma se alegra em prever frutos felizes e abundantes, como aqueles que os católicos souberam colher da sua notável piedade para com Maria. Que, pois, graças aos vossos convites, às vossas recomendações e ao vosso exemplo, os fiéis, especialmente no próximo mês, acorram e se reúnam em torno dos altares, solenemente ornados, da augusta Rainha, da benigníssima Mãe, e com coração filial lhe entreteçam e lhe ofereçam místicas coroas com a recitação, a ela tão grata, do Rosário.

De Nossa parte, confirmamos e ratificamos não só as prescrições já outras vezes dadas a propósito, mas também as sagradas Indulgências já concedidas (Encíclica "Supremi Apostolatus", 1 Set. 1883. Encíclica "Superiore Anno", 30 Ag. 1884, Decreto S. R. C. "Inter Plurimos", 20 Ag. 1885, Encíclica "Quanquam Pluries", 15 Ag. 1889). Oh! como será belo e vantajoso o espectáculo de milhões de fiéis que, em todo o orbe católico - nas cidades, nas aldeias, nos campos, em terra e no mar, - fundindo juntos os seus louvores e as suas preces, os seus pensamentos e as suas vozes, saudarem a todas as horas do dia Maria, invocarem Maria, e tudo esperarem de Maria! Roguem-lhe todos, com confiança, queira Ela obter de seu Filho que as nações transviadas voltem às instituições e aos princípios cristãos, nos quais assenta a base do bem-estar público, e da qual jorram os benefícios da desejada paz e da verdadeira felicidade.

Porém ainda mais insistentemente lhe peçam aquilo que deve estar no ápice dos desejos de todos os bons, ou seja a liberdade da Igreja e a pacífica posse dessa liberdade, de que ela não se serve senão para proporcionar aos homens o bem supremo. Desta liberdade, nem indivíduos nem Estados sofreram jamais dano algum, antes, dela hauriram sempre inúmeros e inestimáveis benefícios.

32. Finalmente, Veneráveis Irmãos, que pela intercessão da Rainha do Rosário, Deus vos conceda os favores e as graças celestes, das quais possais haurir, em sempre maior abundância, auxílio e força para cumprirdes santamente os deveres do vosso ministério pastoral. E delas seja penhor e auspício a Bênção Apostólica que de coração concedemos a vós, ao vosso clero e ao povo confiado aos vossos cuidados.

Dado em Roma, junto a S. Pedro, a 22 de Setembro de 1891, décimo quarto ano do Nosso Pontificado.

LEÃO PP. XIII

(Revisão da versão portuguesa por ama)






Bento VXI – Pensamentos espirituais 20

O sacrifício de Jesus


A Igreja não é santa em si mesma; na verdade, ela é feita de pecadores – todos o sabemos e bem o vemos. Antes, ela é permanentemente santificada pelo amor pelo amor purificador de Cristo. Deus não se limitou a falar: amou-nos de uma maneira muito real, até à morte do seu próprio Filho.


(Homilia na Missa por ocasião da solenidade de São Pedro e São Paulo.  (29.Jun.05)

(in “Bento XVI, Pensamentos Espirituais”, Lucerna 2006)


Fátima: 13 Outubro 1947