15/11/2014

Evangelho diário, coment. L. Esp. (História de uma alma)

Tempo comum XXXII Semana

Santo Alberto Magno - Doutor da Igreja

Evangelho: Lc 18 1-8

1 Disse-lhes também uma parábola, para mostrar que importa orar sempre e não cessar de o fazer: 2 «Havia em certa cidade um juiz que não temia a Deus nem respeitava os homens. 3 Havia também na mesma cidade uma viúva, que ia ter com ele, dizendo: Faz-me justiça contra o meu adversário. 4 Ele, durante muito tempo, não a quis atender. Mas, depois disse consigo: Ainda que eu não tema a Deus nem respeite os homens, 5 todavia, visto que esta viúva me importuna, far-lhe-ei justiça, para que não venha continuamente importunar-me». 6 Então o Senhor acrescentou: «Ouvi o que diz este juiz iníquo. 7 E Deus não fará justiça aos Seus escolhidos, que a Ele clamam dia e noite, e tardará em socorrê-los? 8 Digo-vos que depressa lhes fará justiça. Mas, quando vier o Filho do Homem, julgais vós que encontrará fé sobre a terra?».

Comentário:

Sejam quais forem as circunstâncias mesmo as mais adversas, ou as 'pressões' que sintamos não devemos, nunca, desistir da oração.
A nossa confiança pode sofrer duras provas ao ponto de a enfraquecer, mas se estivermos bem seguros que o Senhor sempre nos ouve, havemos de continuar a pedir sem descanso o que julgamos necessitar. 

(ama, comentário sobre Lc 18, 45-53 2013.10.18)
 

Leitura espiritual




HISTÓRIA DE UMA ALMA

Santa Teresinha do Menino Jesus

MANUSCRITO ENDEREÇADO A MADRE MARIA DE GONZAGA

…/3

Madre querida, contei-vos meu último meio para não ser vencida nos combates: a deserção. Esse meio, empreguei-o durante meu noviciado e sempre deu ótimos resultados. Quero, Madre, citar um exemplo que, creio, vos levará a sorrir. Durante um dos vossos ataques de bronquite, fui uma manhã, de mansinho, entregar-vos as chaves da grade de comunhão, pois eu era sacristã. No fundo, não me desagradava ter essa ocasião de vos ver, estava até muito contente, mas evitava deixar transparecê-lo. Uma irmã, animada por um santo zelo e que, todavia, gostava muito de mim, vendo-me entrar em vossos aposentos, pensou que eu ia vos acordar. Quis tomar de mim as chaves, mas eu era bastante esperta para não entregá-las a ela e ceder-lhe meus direitos. Disse-lhe, com as melhores maneiras, que eu cuidava tanto quanto ela de não vos acordar, mas que cabia a mim entregar as chaves... Agora compreendo que teria sido mais perfeito ceder diante dessa irmã, jovem, é verdade, mas mais antiga que eu. Naquele tempo, não o compreendia. Querendo de todo jeito entrar atrás dela, que empurrava a porta para me impedir de passar, provocamos o que não queríamos: o barulho vos acordou... Então, Madre, tudo recaiu sobre mim. A pobre irmã a quem resisti iniciou um discurso parecido com este: Foi Irmã Teresa do Menino Jesus quem fez barulho... como ela é desagradável... etc. Eu, por acreditar no contrário, fiquei com vontade de defender-me; felizmente, veio-me uma idéia brilhante. Pensei que se eu começasse a justificar-me não conseguiria, certamente, manter a paz da alma; sentia também que não tinha virtude suficiente para me deixar acusar sem reagir. Minha última tábua de salvação foi a fuga. Dito e feito. Saí em surdina, deixando a irmã continuar seu discurso, que parecia com as imprecações de Camilo contra Roma. Meu coração batia com tanta força que não pude ir longe e sentei-me num degrau da escada para saborear em paz os frutos da minha vitória. Não havia bravura nisso, não é verdade, querida Madre? Acredito, porém, que mais vale não se expor à luta quando a derrota é certa. Ai! quando recordo o tempo do meu noviciado, como percebo o quanto eu era imperfeita... Atormentava-me com tão pouca coisa que hoje rio disso. Ah! como o Senhor é bom por ter feito crescer a minha alma, por ter-lhe dado asas... Todas as redes dos caçadores não poderiam me atemorizar pois "em vão se lança a rede diante dos olhos dos que têm asas". Futuramente, sem dúvida, o tempo actual parecer-me-á ainda cheio de imperfeição, mas agora não me espanto com nada, não fico triste por constatar que sou a própria fraqueza, pelo contrário, é nela que me glorifico e espero cada dia descobrir em mim novas imperfeições. Lembrando-me de que a Caridade estende um véu sobre uma multidão de pecados, abasteço-me nessa mina fecunda que Jesus abriu diante de mim. No Evangelho, o Senhor explica em que consiste seu mandamento novo. Diz, em são Mateus: "Ouvistes o que foi dito: `Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo'. Eu, porém, digo-vos: `Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem`. No Carmelo, sem dúvida, não encontramos inimigos, mas há simpatias, sentimos atração por tal irmã enquanto tal outra nos levaria a dar uma longa volta a fim de não encontrar com ela. Sem que se perceba, ela passa a ser objeto de perseguição. Mas Jesus me diz que essa irmã deve ser amada, que se deve rezar por ela, mesmo que seu comportamento me leve a crer que ela não me ama"'. "Se amardes os que vos amam, que merecimento vos é devido? Pois os próprios pecadores amam os que os amam". Não basta amar, é preciso dar provas desse amor. Temos naturalmente prazer em dar presente a um amigo, gosta-se, especialmente, de causar surpresa; mas isso não é caridade pois os pecadores também agem assim. Eis o que Jesus me ensina ainda: "Dá a todo aquele que te pede, e ao que leva o que é teu não lho reclames". Dar a todas aquelas que vos pedem é menos agradável do que oferecer segundo a inclinação do coração; se bem que, quando se pede com gentileza, não custa dar. Porém, se por acaso não se usam palavras delicadas, a alma revolta-se logo caso não seja firmada na caridade. Encontra mil motivos para recusar o que lhe é pedido e só depois de ter convencido a solicitante da sua indelicadeza lhe dá, finalmente e por favor, o que ela deseja, ou lhe presta um leve serviço que teria exigido vinte vezes menos tempo do que foi preciso para exigir direitos imaginários. Se é tão difícil dar a quem quer que peça, é ainda mais difícil deixar levar se pedir de volta. ó Madre, digo que é difícil, deveria dizer que aquilo parece difícil, pois o jugo do Senhor é suave e leve quando aceito, sente-se logo sua doçura e exclama-se com o salmista: "Corri pelo caminho dos vossos mandamentos desde que me dilatastes o coração". Só a caridade pode dilatar o meu coração, ó Jesus. Desde que essa doce chama o consome, corro alegre na via do vosso mandamento novo... Quero correr nela até o dia bem-aventurado em que, unindo-me ao séquito virginal, poderei seguir-vos pelos espaços infinitos, cantando vosso cântico novo que deve ser o do Amor.

Dizia: Jesus não quer que eu reclame o que me pertence; isso deveria parecer-me fácil e natural pois nada me pertence. Renunciei aos bens da terra pelo voto de pobreza, portanto não tenho o direito de queixar-me quando me tiram uma coisa que não me pertence; pelo contrário, devo alegrar-me quando me acontece sentir a pobreza. Houve um tempo em que eu tinha a impressão de não estar apegada a nada, mas depois que entendi as palavras de Jesus vejo que sou muito imperfeita em certas ocasiões. Por exemplo, no serviço da pintura, nada é meu; mas se ao iniciar o trabalho vejo que pincéis e tintas estão fora do lugar, que uma régua ou um canivete sumiram, a paciência ameaça abandona-me e preciso apelar para muita coragem para não reclamar contrariada os objetos que me faltam. É preciso, às vezes, pedir as coisas indispensáveis, mas ao fazê-lo humildemente não pecamos contra o mandamento de Jesus; pelo contrário, agimos como os pobres"-' que estendem a mão para receber o que lhes é necessário. Se são repelidos, não se espantam, ninguém lhes deve coisa alguma. Ah! como a paz inunda a alma quando ela se eleva acima dos sentimentos da natureza... Não há alegria comparável à do pobre de espírito. Se pede corri desapego uma coisa que lhe é necessária e que não apenas lhe é recusada, mas se toma até aquilo que ele possui, segue o conselho de Jesus: "E a quem quiser citar-te em juízo para te tirar a túnica, deixa-lhe também o manto..." Deixar o manto, parece-me, é renunciar aos últimos direitos, é considerar-se como a serva, a escrava das outras. Quando se abandonou o manto, é mais fácil andar, correr, por isso Jesus acrescenta: "E, se alguém te obrigar a andar uma milha, vai com ele duas". Portanto, não é suficiente dar a quem me pede, é preciso antecipar-se a seus desejos, parecer muito grata e muito honrada em prestar serviço, e quando se toma alguma coisa de meu uso não devo parecer sentir falta dela mas, pelo contrário, parecer feliz por ficar livre dela.

Madre querida, estou longe de praticar o que entendo, mas o desejo que tenho de praticar é suficiente para me dar a paz.

Ainda mais do que nos outros dias, sinto que me expressei mal. Fiz uma espécie de discurso sobre a caridade cuja leitura deve ter-vos cansado. Perdoai-me, Madre querida, e pensai que, neste momento, as enfermeiras estão fazendo para mim o que acabo de escrever. Não se incomodam em dar vinte mil passos onde vinte seriam suficientes. Pude, portanto, contemplar a caridade em ação! Sem dúvida, aquilo deve ter perfumado a minha alma, quanto à minha mente, confesso que ficou um pouco paralisada perante tal dedicação e minha pena perdeu a leveza. Para poder expressar meus pensamentos, preciso estar como o pássaro solitário no telhado, e isso me acontece raramente. Quando pego a pena para escrever, eis que uma boa irmã passa perto de mim, com o forcado no ombro. Pensa distrair-me conversando um pouco comigo. Feno, patos, galinhas, visita do médico, tudo é assunto de conversa. Na verdade, isso não se alonga, mas há mais de unia irmã caridosa e, de repente, outra jardineira coloca flores no meu colo, pensando, talvez, inspirar-me idéias poéticas. Como não as procuro neste momento, preferia que as flores ficassem a se balançar nos galhos. Enfim, cansada de abrir e fechar este famoso caderno, abro um livro que não quer ficar aberto e digo firmemente que copio pensamentos dos salmos e do Evangelho para a festa da nossa Madre. Não deixa de ser parcialmente verdade, pois não economizo as citações... Madre querida, creio que eu vos divertiria se vos contasse todas as minhas aventuras nos bosques do Carmelo. Não sei se consegui escrever dez linhas sem ter sido interrompida. Isso não deveria levar-me a rir, nem a me divertir, porém, pelo amor de Deus e das minhas irmãs (tão caridosas para comigo), procuro assumir um ar de contentamento e, sobretudo, ficar contente...

Olhe! eis uma jardineira que se afasta depois de me ter dito num tom compassivo: "Pobre irmãzinha, deveis cansar escrevendo assim o dia todo". "Fiqueis tranquila", respondi, "parece que escrevo muito, mas na verdade escrevo quase nada." "Ainda bem", disse-me com ar tranquilizado, "mas estou muito contente por estarmos recolhendo o feno, isso vos distrai um pouco." De facto, é uma distração tão grande para mim (sem contar as visitas das enfermeiras), que não minto quando digo escrever quase nada.

Felizmente, não desanimo com facilidade. Para comprová-lo, Madre, vou acabar de explicar o que Jesus me fez entender a respeito da caridade. Até agora, só vos falei do exterior, mas gostaria de vos relatar como entendo a caridade puramente espiritual. Tenho certeza de que logo vou misturar as duas, mas, Madre, sendo a vós que falo, estou certa de que não vos será difícil captar meu pensamento e desembaraçar a meada da vossa filha.

Nem sempre é possível, no Carmelo, praticar ao pé da letra as palavras do Evangelho. Devido ao ofício de cada uma, alguém se vê obrigada, às vezes, a recusar uma prestação de serviço. Mas quando a caridade deitou raízes profundas na alma ela se manifesta no exterior. Existe um modo tão gracioso de recusar o que não se pode dar que a recusa agrada tanto quanto a dádiva. É verdade que nos constrangemos menos em pedir um serviço a uma irmã sempre disposta a agradar, mas Jesus disse: "Não voltes as costas a quem te pede emprestado". Assim, com o pretexto de que seríamos obrigadas a recusar, não devemos nos afastar das irmãs que têm o hábito de pedir serviços. Não se deve, tampouco, ser oferecido enquanto interesse, na esperança de uma retribuição futura, pois Nosso Senhor disse: "E, se emprestardes àqueles de quem esperais receber, que merecimento vos é devido? Também os pecadores emprestam aos pecadores, a fim de receberem o equivalente. Mas vós, amai os vossos inimigos e fazei-lhes bem, e emprestai sem nada esperar em troca e vossa recompensa será grande". Oh, sim! a recompensa é grande desde a terra... nessa via, só o primeiro passo custa. Emprestai sem nada esperar, isso parece duro para a natureza, prefere-se dar, pois uma vez dada a coisa não nos pertence mais. Quando vos dizem, com ar totalmente convencido: "Irmã, preciso da vossa ajuda por algumas horas, mas fiqueis tranquila pois tenho a autorização da nossa Madre e vos retribuirei o tempo que me derdes, pois sei o quanto estais atarefada". Na verdade, quando se sabe muito bem que o tempo que emprestamos não será restituído, preferiríamos responder: "Dou-vos esse tempo". Isso satisfaria ao amor-próprio, pois dar é ato mais generoso que emprestar e fazemos sentir à irmã que não esperamos retribuição... Ah! como os ensinamentos de Jesus são contrários aos sentimentos da natureza. Sem a ajuda da sua graça, seria impossível não apenas praticá-los, mas compreendê-los.

Madre, Jesus concedeu à vossa filha a graça de fazê-la penetrar as misteriosas profundezas da caridade; se ela pudesse expressar o que entende, ouviríeis uma melodia do Céu, mas ai! só tenho balbucios a vos oferecer... Se as próprias palavras de Jesus não me servissem de apoio, ficaria tentada a vos pedir clemência e abandonar a pena... Mas preciso prosseguir, por obediência, o que comecei por obediência.

Madre querida, ontem, a respeito dos bens da terra, escrevia que, por não serem meus, não deveria achar difícil nunca reclamar por eles caso me fossem tirados. Os bens do Céu tampouco me pertencem, são emprestados por Deus, que pode tirá-los de mim sem que eu tenha direito de queixa. Porém, os bens que vêm directamente de Deus, os impulsos da inteligência e do coração, os pensamentos profundos, tudo isso forma uma riqueza à qual nos apegamos como se fosse um bem próprio no qual ninguém tem o direito de tocar... Por exemplo, se comunicamos a uma irmã alguma ideia que nos veio durante a oração e, pouco depois, essa mesma irmã fala a uma outra como se aquela ideia fosse dela, parece que toma o que não é seu. Ou, no recreio, diz-se baixinho a uma companheira uma palavra espirituosa e bem apropriada; se ela a repete em voz alta sem indicar a origem, isso parece um furto à proprietária, que não reclama, mas fica com muita vontade de fazê-lo e aproveitará a primeira ocasião para fazer saber, delicadamente, que alguém se apossou das suas palavras.

Madre, eu não poderia explicar-vos tão bem esses tristes sentimentos da natureza, se os não tivesse sentido em meu coração, e gostaria de acalentar a doce ilusão de que só aconteceram comigo se não me tivésseis ordenado ouvir as tentações das vossas queridas novicinhas. Sempre aprendi cumprindo a missão que me confiastes, sobretudo vi-me forçada a praticar o que eu ensinava. Por isso, agora, posso dizer que Jesus me deu a graça de não ser mais apegada aos bens do espírito e do coração que aos da terra. Quando me acontece pensar e_dizer uma coisa que agrada às minhas irmãs, acho natural que se apropriem dela como sendo um bem que lhes pertence. Esse pensamento pertence ao Espírito Santo, não a mim, pois são Paulo disse que, sem esse Espírito de Amor, não podemos chamar de "Pai", a nosso Pai que está nos Céus. Portanto, Ele é livre para servir-se de mim para dar um bom pensamento a uma alma. Se eu julgasse que esse pensamento me pertence, seria como "o burro que transportava relíquias" e acreditava que as homenagens prestadas aos santos dirigiam-se a ele.

Não desprezo os pensamentos profundos que alimentam a alma e a unem a Deus, mas compreendi há muito tempo que não devemos nos apoiar neles nem achar que a perfeição consiste em receber muitas luzes. Os mais belos pensamentos nada são sem as obras. É verdade que outras pessoas podem tirar deles muito proveito se, com humildade, manifestam a Deus sua gratidão por lhes permitir participar do banquete de uma alma que Ele gosta de enriquecer. Mas se essa alma se compraz em seus belos pensamentos, e faz a oração do fariseu, torna-se parecida com uma pessoa que morre de fome diante de uma mesa cheia enquanto todos os seus convidados se fartam e, às vezes, lançam um olhar de inveja sobre o dono de tantas riquezas. Ah! só Deus mesmo para conhecer o fundo dos corações... como as criaturas têm pensamentos pequenos!... Quando descobrem uma alma mais esclarecida que as outras, concluem logo que Jesus as ama menos que a essa alma e que não podem ser chamadas para a mesma perfeição. Desde quando o Senhor perdeu o direito de servir-se de uma das suas criaturas para distribuir às almas que ama o alimento necessário a elas? No tempo dos faraós, o Senhor ainda possuía esse direito, pois na sagrada escritura Ele diz a esse monarca: "Conservei-te com vida para mostrar-te o meu poder e para que meu nome seja celebrado em toda a terra". Os séculos sucederam aos séculos desde que o Altíssimo pronunciou essas palavras e, desde então, seu comportamento não mudou, serviu-se sempre das suas criaturas como instrumentos para realizar sua obra nas almas.

Se a tela pintada por um artista pudesse pensar e falar, certamente não se queixaria por ser retocada sempre por um pincel e não teria inveja da sorte desse instrumento, pois saberia que não é ao pincel, mas ao pintor que o dirige, que ela deve a beleza que a cobre. Por seu lado, o pincel não poderia glorificar-se com a obra-prima feita por ele, sabe que os artistas não se apertam, que zombam das dificuldades, que gostam, às vezes, de usar instrumentos vis e defeituosos...

Madre querida, sou um pincelzinho que Jesus escolheu para pintar sua imagem nas almas que me confiastes. Um artista não se restringe a um pincel, precisa, pelo menos, de dois. O primeiro é o mais útil, é com ele que imprime as tonalidades mais gerais, que cobre completamente a tela em muito pouco tempo; o outro, o menor, serve para os detalhes.

A primeira vez que Jesus se serviu do seu pincelzinho foi por volta de 8 de Dezembro de 1892. Lembrar-me-ei sempre dessa época como de um tempo de graças. Vou, querida Madre, confiar-vos essas doces recordações.

Aos 15 anos, quando tive a felicidade de ingressar no Carmelo, encontrei uma companheira de noviciado que me tinha precedido alguns meses. Era oito anos mais velha que eu, mas seu caráter infantil fazia esquecer a diferença dos anos; por isso, tivestes, Madre, a alegria de ver vossas duas pequenas postulantes entenderem-se maravilhosamente e tornarem-se inseparáveis. A fim de favorecer essa afeição nascente, que vos parecia promissora de bons frutos, permitistes que tivéssemos, de tempos em tempos, breves conversas espirituais. Minha querida companheirinha encantava-me com sua inocência, seu caráter expansivo, mas eu estranhava ao constatar que o afecto que tinha por vós era diferente do meu. Havia muitas outras coisas em seu comportamento com as irmãs que eu desejava que ela mudasse... Desde aquele tempo, Deus fez-me compreender haver almas que sua misericórdia espera sem cansar, às quais dá sua luz aos poucos. Por isso, eu tinha o cuidado de não apressar sua hora e esperava pacientemente que Jesus a fizesse chegar.

Reflectindo sobre a permissão concedida para nos entreter, de acordo com as nossas santas constituições, para nos inflamar mais no amor por nosso Esposo, pensei com pesar que nossas conversas não alcançavam a meta desejada. Deus fez-me sentir, então, que chegara o momento em que eu devia falar ou encerrar essas conversações que mais se pareciam com as das amigas do mundo. Era um sábado. No dia seguinte, durante minha acção de graças, pedi a Deus para que pusesse em minha boca palavras suaves e convincentes, ou melhor, que Ele mesmo falasse por meu intermédio. Jesus atendeu ao meu pedido e permitiu que o resultado correspondesse inteiramente à minha expectativa, pois: "olhai para ele e sereis esclarecidos" e "brilha para os retos, qual farol nas trevas, o Benigno, o Misericordioso e o Justo". A primeira citação dirige-se a mim e a segunda à minha companheira que, na verdade, tinha o coração recto...

(cont)




Temas para meditar - 272


Anjos


As primeiras obras da criação divina que conhecemos são os Anjos. Um anjo é um espírito, quer dizer, um ser com inteligência e vontade, mas sem corpo, sem dependência alguma da matéria. (...) Um anjo sem corpo é uma criatura completa (...) um anjo é muito superior ao ser humano (...) a beleza deslumbrante, a inteligência poderosa e o formidável poder de um anjo. Se isto é assim na ordem inferior das hostes celestiais - na ordem dos propriamente chamados anjos -, que não dizer das ordens ascendentes de espíritos puros que se encontram acima dos anjos? (...) É muito possível, as virtudes, as dominações que um arcanjo esteja a tanta distância de um anjo, em perfeição, como este de um homem.


(leo j. treseA Fé Explicada, Edições Quadrante, SÃO Paulo, 4ª Ed., nr. 31-38)

Temas para meditar - 284


Salvador



Cristo, e só Ele é o Salvador, que Se entrega em completa liberdade por nós; mas os homens só podem beneficiar plenamente da salvação que Cristo nos consegue, se, livremente, nos unimos a Ele com a nossa entrega pessoal, que se manifesta na oração vigilante.


(javier echevarriaGetsemani, Planeta, 3ª Ed. Pg. 1149) 

Urge cristianizar a sociedade

Como quer o Mestre, tu tens de ser – bem metido neste mundo, que nos coube em sorte, e em todas as actividades dos homens – sal e luz. Luz, que ilumina as inteligências e os corações; sal, que dá sabor e preserva da corrupção. Por isso, se te faltar afã apostólico, tornar-te-ás insípido e inútil, defraudarás os outros e a tua vida será um absurdo. (Forja, 22)


O Senhor não nos criou para construirmos aqui uma Cidade definitiva, porque este mundo é o caminho para o outro, que é morada sem pesar. No entanto, nós, os filhos de Deus, não devemos desligar-nos das actividades terrenas em que Deus nos coloca para as santificarmos, para as impregnarmos da nossa bendita fé, a única que dá verdadeira paz, alegria autêntica às almas e aos diversos ambientes. Tem sido esta a minha pregação constante desde 1928: urge cristianizar a sociedade; levar a todos os estratos desta nossa humanidade o sentido sobrenatural, de modo que uns e outros nos empenhemos em elevar à ordem da graça a ocupação diária, a profissão ou o ofício. Desta forma, todas as ocupações humanas se iluminam com uma esperança nova, que transcende o tempo e a caducidade do mundano. (Amigos de Deus, 210)

Tratado do verbo encarnado 30

Questão 4: Da união relativamente ao assumido

Art. 5 — Se o Filho de Deus devia ter assumido a natureza humana em todos os indivíduos.

O quinto discute-se assim. — Parece que o Filho de Deus devia ter assumido a natureza humana em todos os indivíduos.

1. — Pois, o primário e em si mesmo assumido foi a natureza humana. Ora, o conveniente a uma natureza em si mesma o é também a tudo o existente nessa mesma natureza. Logo, era conveniente que a natureza humana fosse assumida pelo Verbo de Deus em todos os seus supostos.

2. Demais. — A Encarnação divina procedeu da caridade divina, donde o dizer o Evangelho: Assim amou Deus ao mundo, que lhe deu o seu Filho unigénito. Ora, a caridade leva-nos a nos darmos aos amigos o quanto possível. Ora era possível ao Filho de Deus ter assumido várias naturezas humanas, como se disse, e todas pela mesma razão. Logo, fora conveniente que o Filho de Deus assumisse a natureza humana em todos os seus supostos.

3. Demais. — Um agente perito pratica os seus actos pela via mais breve possível. Ora, teria sido uma via mais breve se todos os homens tivessem sido assumidos à filiação natural, do que, por um Filho natural, muitos terem recebido a adopção de filhos, como diz o Apóstolo. Logo, a natureza humana devia ter sido assumida pelo Filho de Deus em todos os seus supostos.

Mas, em contrário, diz Damasceno, que o Filho de Deus não assumiu a natureza humana considerada especificamente, nem, pois, lhe assumiu todas as hipóstases.

Não era conveniente que a natureza humana fosse assumida pelo Verbo em todos os seus supostos. — Primeiro, porque desapareceria assim a multidão dos supostos da natureza humana, que lhe é conatural. Pois, não se devendo considerar, na natureza assumida, outro suposto além da Pessoa assumente, como se disse, se não existisse a natureza humana senão assumida, resultaria a existência de um só suposto da natureza humana, a saber, a Pessoa assumente. — Segundo, porque tal seria contra a dignidade do Filho de Deus encarnado, enquanto é o primogénito entre muitos irmãos, segundo a natureza humana, assim como é o primogénito de toda a criatura, segundo a natureza divina. E teriam então todos os homens a mesma dignidade. — Terceiro, porque era conveniente que, assim como um suposto divino se encarnou, assim assumisse uma só natureza humana, para haver, de ambos os lados, unidade.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Ser assumida convém à natureza humana como tal, isto é, porque não lhe convém em razão da pessoa, assim como convém à natureza divina assumir em razão da pessoa. Pois, não lhe convém em si mesma, como lhe pertencendo aos princípios essenciais, ou como uma propriedade natural sua, por cujo modo conviria a todos os seus supostos.

RESPOSTA À SEGUNDA. — O amor de Deus pelos homens manifesta-se não só na mesma assunção da natureza humana, mas sobretudo pelos seus sofrimentos, na natureza humana, pelos outros homens, segundo o Apóstolo: Mas Deus faz brilhar a sua caridade em nós, porque, ainda quando eramos pecadores, morreu Cristo por nós. O que não teria lugar se tivesse assumido a natureza humana em todos.

RESPOSTA À TERCEIRA. — É por causa da brevidade da via que o agente perito toma, que não faz por muitos meios o que pode suficientemente fazer por um só. Por isso, foi convenientíssimo que por um só homem todos os outros fossem salvos.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.