02/12/2014

Temas para meditar - 289


Servir



Não mereço prémio algum por proceder bem, antes mereço castigo se actuo mal.

Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer (Lc 17, 10).



(ama, Reflexões, 2005.01.13)

Um só coração e uma só alma

Hás-de ser, como filho de Deus e com a sua graça, varão ou mulher forte, de desejos e de realidades. Não somos plantas de estufa. Vivemos no meio do mundo e temos de estar a todos os ventos, ao calor e ao frio, à chuva e aos ciclones..., mas fiéis a Deus e à sua Igreja. (Forja, 792)

O trabalho da Igreja, cada dia, é como um grande tecido que oferecemos a Nosso Senhor, porque todos os baptizados somos Igreja.

Se cumprirmos – fiéis e entregues –, este grande tecido será formoso e sem defeito. Mas, se se solta um fio aqui, outro ali e outro pelo outro lado..., em vez de um bonito tecido, teremos um farrapo feito em tiras. (Forja, 640)

Pede a Deus que na Santa Igreja, nossa Mãe, os corações de todos, como na primitiva cristandade, sejam um só coração, para que até ao fim dos séculos se cumpram de verdade as palavras da Escritura: "multitudinis autem credentium erat cor unum et anima una", a multidão dos fiéis tinha um só coração e uma só alma.

– Falo-te muito seriamente: que por tua causa não se lese esta unidade santa. Leva isto à tua oração! (Forja, 632)


Oferece a oração, a expiação e a acção por esta finalidade: "ut sint unum!", para que todos os cristãos tenham uma mesma vontade, um mesmo coração, um mesmo espírito: para que "omnes cum Petro ad Iesum per Mariam!", todos, bem unidos ao Papa, vamos a Jesus, por Maria. (Forja, 647)

Bento VXI – Pensamentos espirituais 27


A sabedoria


Entendo por sabedoria a compreensão daquilo que é importante, o olhar que capta o essencial... A sabedoria da fé não consiste em dominar uma grande quantidade de pormenores, o que é próprio de uma profissão, mas em olhar para além dos pormenores e identificar o essencial da vida: como ser Pessoa, como construir o futuro.

(Entrevista à Rádio Vaticano. (14.Ago.05)


(in “Bento XVI, Pensamentos Espirituais”, Lucerna 2006)

Tratado do verbo encarnado 47

Questão 7: Da graça de Cristo como um homem particular

Em seguida devemos tratar do que o Verbo de Deus consumou, ao assumir a natureza humana. E primeiro do que respeita à perfeição. Segundo, do que respeita aos defeitos.

No primeiro ponto consideram-se três outros. Primeiro, da graça de Cristo. Segundo, da sua ciência. Terceiro, do seu poder.

Quanto à graça de Cristo ela dá lugar a duas considerações. Primeiro, da sua graça enquanto um homem particular. Segundo, da sua graça enquanto Chefe da Igreja. Pois, da graça da união já tratamos.

Na primeira questão discutem-se treze artigos:

Art. 1 — Se na alma assumida pelo Verbo havia a graça habitual.
Art. 2 — Se em Cristo havia virtudes.
Art. 3 — Se em Cristo existiu a fé.
Art. 4 — Se em Cristo existia a esperança.
Art. 5 — Se em Cristo existiam os dons.
Art. 6 — Se em Cristo houve o dom do temor.
Art. 7 — Se em Cristo havia as graças gratuitas.
Art. 8 — Se Cristo teve a profecia.
Art. 9 — Se Cristo tinha a plenitude da graça.
Art. 10 — Se a plenitude da graça é própria de Cristo.
Art. 11 — Se a graça de Cristo era infinita.
Art. 12 — Se a graça de Cristo podia aumentar.
Art. 13 — Se a graça habitual em Cristo era uma consequência da união.

Art. 1 — Se na alma assumida pelo Verbo havia a graça habitual.

O primeiro discute-se assim. — Parece que na alma assumida pelo Verbo não havia a graça habitual.

1. — Pois, a graça é uma certa participação da divindade na criatura racional, segundo a Escritura: Pelo qual nos comunicou as mui grandes e preciosas graças que tinha prometido, para que sejamos feitos participantes da natureza divina. Ora, Cristo é Deus, não participativa mas verdadeiramente. Logo, nele não houve graça habitual.

2. Demais. — A graça é necessária ao homem para proceder bem, segundo o Apóstolo: Tenho trabalhado mais copiosamente que todos eles, não eu contudo, mas a graça de Deus comigo. E também para alcançar a vida eterna, segundo ainda o Apóstolo: A graça de Deus é a Vida perdurável. Ora, a Cristo, só pelo facto de ser naturalmente o Filho de Deus, era-lhe devida a herança da vida eterna, e também por ser o Verbo, pelo qual todas as coisas foram feitas, tinha a faculdade de proceder bem em todas as coisas. Logo, não precisava, em virtude da sua natureza humana, de outra graça, senão da união com o Verbo.

3. Demais. — O que opera a modo de instrumento não precisa de nenhum hábito para as suas operações próprias, porque o hábito funda-se no agente principal. Ora, a natureza humana, em Cristo, era como o instrumento da divindade, no dizer de Damasceno. Logo, não devia de haver, em Cristo, nenhuma graça habitual.

Mas, em contrário, a Escritura: Descansará sobre ele o Espírito do Senhor, do qual se diz que está no homem pela graça habitual, como se demonstrou na Primeira Parte. Logo, em Cristo havia a graça habitual.

Devemos admitir em Cristo a graça habitual, por três razões. — Primeiro, por causa da união da sua alma com o Verbo de Deus. Pois, quanto mais próximo está um ser da causa que influi sobre ele, tanto mais participa da sua influência. Ora, o influxo da graça vem de Deus, segundo a Escritura: O Senhor dará a graça e a glória. Por isso era conveniente em máximo grau que a sua alma recebesse o influxo da graça divina. — Segundo, por causa da nobreza da sua alma, cujas operações deviam tocar a Deus de muito perto pelo conhecimento e pelo amor, e para isso é preciso a natureza humana ser elevada pela graça. — Terceiro, por causa das relações de Cristo com o género humano. Pois, Cristo enquanto homem é o mediador entre Deus e os homens, no dizer do Apóstolo. Por isso deveria ter uma graça capaz de redundar nos outros, conforme o Evangelho: Todos nós participamos de sua plenitude.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Cristo é verdadeiramente Deus pela pessoa e pela natureza divina. Mas, como com a unidade de pessoa subsiste a distinção das naturezas, conforme do sobredito se colige, a alma de Cristo não é por sua essência divina. Donde, havia de se tornar divina por participação, que é segundo a graça.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A Cristo, enquanto por natureza filho de Deus, é devida a herança eterna, que é a própria beatitude incriada, pelo acto incriado do conhecimento e do amor de Deus, acto que é o mesmo pelo qual o Pai se conhece e ama a si mesmo. E a alma não era capaz desse acto por causa da diferença de natureza. Por isso, era necessário que se alçasse a Deus por um acto criado de fruição. O que não pode ser senão pela graça. — Semelhantemente, enquanto Verbo de Deus, tinha a faculdade de proceder bem em tudo, por operação divina. Mas, como além da operação divina, devemos admitir nele a operação humana, conforme a seguir se demonstrará, era mister que tivesse a graça habitual, que torna perfeita a sua referida operação.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A humanidade de Cristo é o instrumento da divindade, não, naturalmente, como um instrumento inanimado, que de nenhum modo age mas é manejado por outro, mas como um instrumento animado pela alma racional, que é manejado por outro mas de modo que também age. E portanto, para a sua acção própria era necessário que tivesse a graça habitual.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


Ev. coment. L. esp. (Cristo que passa)

Advento I Semana

Evangelho: Lc 10 21-24

21 Naquela mesma hora Jesus exultou de alegria no Espírito Santo, e disse: «Graças Te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos prudentes, e as revelaste aos simples. Assim é, ó Pai, porque assim foi do Teu agrado. 22 Todas as coisas Me foram entregues por Meu Pai; e ninguém sabe quem é o Filho, senão o Pai, nem quem é o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelar». 23 Depois, tendo-Se voltado para os discípulos, disse: «Felizes os olhos que vêem o que vós vedes. 24 Porque Eu vos afirmo que muitos profetas e reis desejaram ver o que vós vedes e não o viram, ouvir o que vós ouvis e não o ouviram».

Comentário

Quando penso na ventura daqueles que contemplavam e ouviam o Mestre, conviviam com Ele diariamente, O acompanhavam no Seu caminhar incessante pelas terras de Israel, sinto, por vezes, uma certa inveja: Ah! Se e estivesse entre eles!
Depois, lembro-me imediatamente que, na verdade, tenho uma ventura muito maior e completa. Continuo a ouvir quanto o Senhor disse, a poder, em qualquer momento, contar com a Sua companhia onde quer que eu vá, porque está sempre comigo, e, mais importante, posso recebê-lo como alimento para a minha alma. Então, em vez de inveja sinto uma enorme gratidão que me leva a dizer-lhe do fundo da minha alma: Gratias Tibi! Gratias Tibi!

(ama, meditação sobre Lc 10, 21-24, 2009.07.13)

Leitura espiritual



São Josemaria Escrivá

Cristo Que passa 160 a 164

160           
Tenhamos, pois, Fé, sem permitir que o desalento nos domine; sem nos determos em cálculos meramente humanos. Para superar os obstáculos, há que começar a trabalhar, metendo-se em cheio nessa tarefa, de maneira que o nosso próprio esforço nos leve a abrir novos caminhos. Perante qualquer dificuldade, o remédio é este: santidade pessoal, entrega ao Senhor.

Ser santos é viver tal como o nosso Pai do Céu dispôs que vivêssemos. Dir-me-eis que é difícil. Sim, o ideal é muito elevado. Mas ao mesmo tempo é fácil: está ao alcance da mão. Quando uma pessoa adoece, nem sempre se consegue encontrar o remédio adequado para a tratar. Mas no plano sobrenatural não acontece assim. O remédio está sempre perto de nós: é Jesus Cristo, presente na Sagrada Eucaristia, que também nos dá a sua graça nos outros Sacramentos que instituiu.

Repitamos com a palavra e com as obras: Senhor, confio em Ti, basta-me a tua providência ordinária, a tua ajuda de cada dia. Não temos por que pedir a Deus grandes milagres. Temos de lhe suplicar, pelo contrário, que aumente a nossa fé, que ilumine a nossa inteligência, que fortaleça a nossa vontade. Jesus está sempre junto de nós e permanece fiel.

Desde o começo da minha pregação, preveni-vos contra um falso endeusamento. Não te assustes ao veres-te tal como és: assim, feito de barro. Não te preocupes. Porque, tu e eu somos filhos de Deus, - este é o endeusamento bom - escolhidos desde a eternidade, com uma vocação divina: escolheu-nos o Pai, por Jesus Cristo, antes da criação do mando, para que sejamos santos diante dele. Nós, que somos especialmente de Deus, seus instrumentos apesar da nossa pobre miséria pessoal, seremos eficazes se não perdermos o conhecimento da nossa fraqueza. As tentações dão-nos a dimensão da nosso própria fraqueza.

Se sentimos desalento ao experimentar - talvez de um modo particularmente vivo - a nossa mesquinhez, é o momento de nos abandonarmos por completo, com docilidade, nas mãos de Deus. Conta-se que, certo dia, um mendigo saiu ao encontro de Alexandre Magno, pedindo uma esmola. Alexandre parou e ordenou que o fizessem senhor de cinco cidades. O pobre, confundido e atordoado, exclamou: eu não pedia tanto! E Alexandre respondeu: tu pediste como quem és; eu dou-te como quem sou.

Mesmo nos momentos em que percebemos mais profundamente a nossa limitação, podemos e devemos olhar para Deus Pai, Deus Filho, Deus Espírito Santo, sabendo-nos participantes da vida divina. Nunca existe razão suficiente para voltarmos atrás: o Senhor está ao nosso lado. Temos que ser fiéis, leais, encarar as nossas obrigações, encontrando em Jesus o amor e o estímulo para compreender os erros dos outros e superar os nossos próprios erros. Assim, todos esses desalentos - os teus, os meus, os de todos os homens - servem também de suporte ao reino de Cristo.

Reconheçamos as nossas fraquezas, mas confessemos o poder de Deus. O optimismo, a alegria, a convicção firme de que o Senhor quer servir-se de nós têm de informar a vida cristã. Se nos sentirmos parte dessa Igreja Santa, se nos considerarmos sustentados pela rocha firme de Pedro e pela acção do Espírito Santo, decidir-nos-emos a cumprir o pequeno dever de cada instante: semear todos os dias um pouco. E a colheita fará transbordar os celeiros.

161           
Terminemos este tempo de oração. Recordai - saboreando, na intimidade da alma, a infinita bondade divina - que, pelas palavras da Consagração, Cristo vai tornar-se realmente presente na Hóstia, com o seu Corpo, Sangue, Alma e Divindade. Adorai-O com reverência e devoção; renovai na sua presença o oferecimento sincero do vosso amor; dizei-lhe sem medo que Lhe quereis; agradecei-lhe esta prova diária de misericórdia tão cheia de ternura, e fomentai o desejo de vos aproximardes da comunhão com confiança. Eu surpreendo-me perante este mistério de Amor: o Senhor procura como trono o meu pobre coração, para não me abandonar, se eu não me afastar d'Ele.

Reconfortados pela presença de Cristo, alimentados pelo seu Corpo, seremos fiéis durante esta vida terrena, e mais tarde no Céu, junto de Jesus e de Sua Mãe, chamar-nos-emos vencedores. Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão? Demos graças a Deus que nos trouxe a vitória, pela virtude de Nosso Senhor Jesus Cristo.

162           
Homilia pronunciada no dia 17 de Junho de 1966, Festa do Sagrado Coração de Jesus.

Deus Pai dignou-Se conceder-nos, no Coração do Filho, infinitos dilectionis thesauros, tesouros inesgotáveis de amor, de misericórdia, de ternura. Se quisermos descobrir com evidência que Deus nos ama - que não só escuta as nossas orações, mas até Se nos antecipa - basta-nos seguir o mesmo raciocínio de S. Paulo: Aquele que nem ao seu próprio Filho perdoou, mas O entregou à morte por nós, corno não nos dará, com Ele, todas as coisas?

A graça renova o homem por dentro e converte-o, de pecador e rebelde, em servo bom e fiel. E a fonte de todas as graças é o amor que Deus tem por nós e nos revelou - e não só com palavras, também com actos. O amor divino faz com que a Segunda Pessoa da Trindade Santíssima, o Verbo, o Filho de Deus Pai, tome a nossa carne, isto é, a nossa condição humana, menos o pecado. E o Verbo, a Palavra de Deus, é Verbum spirans amorem, a Palavra de que procede o Amor.

O Amor revela-se na Encarnação, nessa caminhada redentora de Jesus Cristo pela Terra, até ao sacrifício supremo da Cruz. E na Cruz manifesta-se com um novo sinal: um dos soldados abriu o lado de Jesus com uma lança e no mesmo instante saiu sangue e água . Água e sangue de Jesus que nos falam de uma entrega realizada até ao último extremo, até ao consummatum est , ao "tudo está consumado", por amor.

Na festa de hoje, ao considerarmos uma vez mais os mistérios centrais da nossa fé, maravilhamo-nos de que as realidades mais profundas - o amor de Deus Pai que entrega o seu Filho; o amor do Filho que O leva a caminhar sereno até ao Gólgota - se traduzam em gestos muito próximos dos homens. Deus não Se nos dirige numa atitude de poder e de domínio; aproxima-Se de nós tomando a forma de servo, tornado semelhante aos homens. Nunca Jesus Se mostra distante e altivo. Por vezes, durante os anos de pregação, podemos vê-Lo desgostoso por lhe doer a maldade humana. Mas, se repararmos melhor, logo perceberemos que o que Lhe provoca o desgosto ou a cólera é o amor, que o desgosto e a cólera são apenas um novo modo de nos arrancar à infidelidade e ao pecado. Porventura quero Eu a morte do ímpio - diz o Senhor Deus - e não que se converta do seu mau caminho e que viva? Essas palavras explicam-nos toda a vida de Cristo e fazem-nos compreender por que Se apresentou perante nós com um coração de carne, com um coração como o nosso, prova irrefutável de amor e testemunho constante do mistério inenarrável da caridade divina.

163           
Conhecer o coração de Jesus

Não posso deixar de vos confiar algo que constitui para mim um motivo de pena e ao mesmo tempo um estímulo para a acção: pensar nos homens que ainda não conhecem Cristo, que não pressentem ainda a profundeza da felicidade que nos espera nos Céus e vagueiam pela Terra, como cegos, em perseguição de uma alegria cujo verdadeiro nome ignoram, ou se perdem por sendas que os afastam da felicidade autêntica. Como se entende bem o que deve ter sentido o Apóstolo Paulo, naquela noite da cidade de Tróade, quando, entre sonhos, teve uma visão: um macedónio estava diante dele, pedindo-lhe: passa à Macedónia e ajuda-nos! Mal acabou a visão, logo - Paulo e Timóteo - buscaram maneira de passar à Macedónia, certos de que Deus os chamava para pregarem o Evangelho àquelas gentes.

Não sentis vós também que Deus nos chama, que - através de tudo o que se passa à nossa volta - nos impele a proclamar a boa-nova da vinda de Jesus? Mas, às vezes, nós, cristãos, amesquinhamos a nossa vocação, caímos na superficialidade, perdemos o tempo em disputas e querelas. Ou, o que é pior ainda, não falta quem se escandalize falsamente com o modo como os outros vivem certos aspectos da Fé ou determinadas devoções e, em vez de serem eles a abrir o caminho, esforçando-se por vivê-las da maneira que consideram recta, entretêm--se a destruir e a criticar. É claro que podem surgir, e de facto surgem, deficiências na vida dos cristãos. O que importa, porém, não somos nós e as nossas misérias; só Ele importa, só Jesus. É de Cristo que devemos falar; não de nós mesmos.

As reflexões que acabo de fazer são provocados por uma suposta crise na devoção ao Sagrado Coração de Jesus. Tal crise não existe. A verdadeira devoção foi e continua a ser uma atitude viva, cheia de sentido humano e de sentido sobrenatural. Os seus frutos têm sido e continuam a ser frutos saborosos de conversão, de entrega, de cumprimento da vontade de Deus, de penetração amorosa nos mistérios da Redenção.

Bem diversas, pelo contrário, são as manifestações de um sentimentalismo ineficaz, vazio de doutrina, eivado de pietismo. Também eu não gosto das imagens delambidas, dessas figurações do Sagrado Coração que não podem inspirar devoção nenhuma a pessoas com senso comum e com sentido sobrenatural próprio de cristãos. Mas não é sinal de boa lógica converter certos abusos de ordem prática, que acabam por desaparecer, num problema doutrinário, de ordem teológica.

Se crise existe, é no coração dos homens, que - por miopia, por egoísmo, por estreiteza de vistas - não são capazes de vislumbrar o insondável amor de Cristo Senhor Nosso. A liturgia da Santa Igreja, desde que se instituiu a festa de hoje, tem sabido oferecer o alimento da verdadeira piedade, recolhendo como leitura para a Missa um texto de S. Paulo em que nos é proposto todo um programa de vida contemplativa - conhecimento e amor, oração e vida - que começa por esta devoção ao Coração de Jesus. 0 próprio Deus, pela boca do Apóstolo, nos convida a seguir esse caminho: que Cristo habite pela fé nos vossos corações, e que, arreigados e cimentados na caridade, possais compreender com todos os santos qual é a amplitude e a grandeza, a altura e a profundidade do mistério; e conhecer também aquele amor de Cristo que ultrapassa todo o conhecimento, para vos encherdes de toda a plenitude de Deus .

A plenitude de Deus revela-se-nos em Cristo e é em Cristo que nos é dada: no seu amor, no seu Coração. Porque este é o Coração d'Aquele em quem habita corporalmente toda a plenitude da divindade. Por isso, se se perde de vista este alto desígnio de Deus, - a corrente de amor instaurada no mundo pela Encarnação, pela Redenção e pelo Pentecostes - não se poderão compreender as delicadezas do Coração do Senhor.

164           
A verdadeira devoção ao coração de Cristo

Consideremos toda a riqueza que se encerra nestas palavras: Sagrado Coração de Jesus.

Quando falamos de um coração humano, não nos referimos só aos sentimentos: aludimos à pessoa toda que quer, que ama, que convive com os outros. Ora, na maneira de os homens se exprimirem, que a Sagrada Escritura utiliza para nos dar a entender as coisas divinas, o coração é tido por resumo e fonte, expressão e fundo íntimo dos pensamentos, das palavras, das acções. Um homem vale o que vale o seu coração - diríamos com palavras bem humanas.

Ao coração pertence a alegria: alegre-se o meu coração com o teu auxílio!; o arrependimento: o meu coração é como cera que se derrete dentro do peito; o louvor a Deus: do meu coração brota um cântico belo; a decisão para ouvir o Senhor: está disposto o meu coração; a vigília amorosa: eu durmo, mas o meu coração vigia. E ainda a dúvida e o temor: não se perturbe o vosso coração; crede em Mim.

O coração não sente apenas: também sabe e entende. A lei de Deus é recebida no coração, e nele permanece escrita. E a Escritura acrescenta: a boca fala da abundância do coração. O Senhor lançou em rosto a uns escribas: porque pensais mal em vossos corações? E, para resumir todos os pecados que um homem pode cometer, disse: é do coração que saem todos os maus pensamentos, os homicídios, os adultérios, as fornicações, os furtos, os falsos testemunhos, as blasfémias.

Quando, na Sagrada Escritura, se fala de coração, não se trata de um sentimento passageiro, que perturba ou faz nascer as lágrimas. Fala-se do coração para indicar a pessoa, pois esta, como disse o próprio Jesus, orienta-se toda - alma e corpo - para o que considera o seu bem: porque onde está o teu tesouro, aí está também o teu coração.

É por isso que, quando falamos do coração de Jesus, manifestamos a certeza do amor de Deus e a verdade da sua entrega a nós mesmos. Recomendar a devoção a esse Sagrado Coração é o mesmo que dizer que nos devemos orientar integralmente, com tudo o que somos - a nossa alma, os nossos sentimentos, os nossos pensamentos, palavras e acções, os nossos trabalhos e as nossas alegrias - para Jesus todo.

Nisto se define a verdadeira devoção ao Coração de Jesus: em conhecer a Deus e conhecermo-nos a nós mesmos, e em olhar para Jesus e recorrer a Ele - que nos anima, nos ensina, nos guia. A única superficialidade que pode haver nesta devoção é a do homem que não é integralmente humano e que, por isso, não consegue aperceber-se da realidade de Deus feito carne.

(cont)






Pequena agenda do cristão


TeRÇa-Feira

(Coisas muito simples, curtas, objectivas)






Propósito:
Aplicação no trabalho.

Senhor, ajuda-me a fazer o que devo, quando devo, empenhando-me em fazê-lo bem feito para to poder oferecer.

Lembrar-me:
Os que estão sem trabalho.

Senhor, lembra-te de tantos e tantas que procuram trabalho e não o encontram, provê às suas necessidades, dá-lhes esperança e confiança.

Pequeno exame:
Cumpri o propósito que me propus ontem?