23/02/2015

O mandamento novo do amor

Jesus Nosso Senhor amou tanto os homens, que encarnou, tomou a nossa natureza e viveu em contacto diário com pobres e ricos, com justos e pecadores, com novos e velhos, com gentios e judeus. Dialogou constantemente com todos: com os que gostavam dele e com os que só procuravam a maneira de retorcer as suas palavras, para o condenar. – Procura comportar-te como Nosso Senhor. (Forja, 558)


Compreende-se muito bem a impaciência, a angústia, os inquietos anseios daqueles que, com uma alma naturalmente cristã, não se resignam perante a injustiça individual e social que o coração humano é capaz de criar. Tantos séculos de convivência dos homens entre si, e ainda tanto ódio, tanta destruição, tanto fanatismo acumulado em olhos que não querem ver e em corações que não querem amar!

Os bens da Terra, repartidos entre muito poucos; os bens da cultura, encerrados em cenáculos... E, lá fora, fome de pão e de sabedoria; vidas humanas – que são santas, porque vêm de Deus – tratadas como simples coisas, como números de uma estatística! Compreendo e compartilho dessa impaciência, levantando os olhos para Cristo, que continua a convidar-nos a pormos em prática o mandamento novo do amor.


É preciso reconhecer Cristo que nos sai ao encontro nos nossos irmãos, os homens. Nenhuma vida humana é uma vida isolada; entrelaça-se com as demais. Nenhuma pessoa é um verso solto; todos fazemos parte de um mesmo poema divino, que Deus escreve com o concurso da nossa liberdade. (Cristo que passa, 111)

Evangelho, coment. L espirit. (Santíssima Virgem)

Quaresma I Semana

Evangelho: Mt 25 31-46

31 «Quando, pois, vier o Filho do Homem na Sua majestade, e todos os anjos com Ele, então Se sentará sobre o trono de Sua majestade. 32 Todas as nações serão congregadas diante d'Ele, e separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos, 33 e porá as ovelhas à sua direita, e os cabritos à esquerda. 34 «Dirá então o Rei aos que estiverem à Sua direita: “Vinde, benditos de Meu Pai, possuí o reino que vos está preparado desde a criação do mundo, 35 porque tive fome, e Me destes de comer; tive sede, e Me destes de beber; era peregrino, e Me recolhestes; 36 nu, e Me vestistes; enfermo, e Me visitastes; estava na prisão, e fostes ver-Me”. 37 Então, os justos Lhe responderão: “Senhor, quando é que nós Te vimos faminto, e Te demos de comer; com sede, e Te demos de beber? 38 Quando Te vimos peregrino, e Te recolhemos; nu, e Te vestimos? 39 Ou quando Te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos visitar-Te?”. 40 O Rei, respondendo, lhes dirá: “Em verdade vos digo que todas as vezes que vós fizestes isto a um destes Meus irmãos mais pequenos, a Mim o fizestes”. 41 Em seguida, dirá aos que estiverem à esquerda: “Apartai-vos de Mim, malditos, para o fogo eterno, que foi preparado para o demónio e para os seus anjos; 42 porque tive fome, e não Me destes de comer; tive sede, e não Me destes de beber; 43 era peregrino, e não Me recolhestes; estava nu, e não Me vestistes; enfermo e na prisão, e não Me visitastes”. 44 Então, eles também responderão: “Senhor, quando é que nós Te vimos faminto ou com sede, ou peregrino, ou nu, ou enfermo, ou na prisão, e não Te assistimos?”. 45 E lhes responderá: “Em verdade vos digo: Todas as vezes que o não fizestes a um destes mais pequenos, foi a Mim que não o fizestes”. 46 E esses irão para o suplício eterno; e os justos para a vida eterna».

Comentário

Nestes tempos que correm em que uma “loucura do ter posses custe o que custar mesmo que seja preciso atropelar pessoas e fazer das leis letra morta” julgo que se aplica este aviso solene de Jesus Cristo.

A justiça não se mede nos tribunais mas sim no coração e no comportamento de cada um.

Quem é injusto para com a sociedade em geral e alguns em particular não pode esperar outra coisa que um tratamento semelhante.

As “contas” a prestar serão rigorosas e justíssimas porque o Senhor é, antes de mais, supremamente justo.

(ama, comentário sobre Mt 25, 31-46, 2014.11.23)


Leitura espiritual


Santíssima Virgem
Vida de Maria (XI)

Regresso a Nazaré

Neste mês contemplam-se os primeiros anos da Sagrada Família em Nazaré, no regresso do Egipto, quando Jesus ia crescendo e fortificando-Se como homem, graças aos cuidados de Maria e de José.

Não se sabe com certeza o tempo que durou a estada da Sagrada Família no Egipto. A maior parte dos estudiosos pensa que se prolongou por um ou dois anos. São Mateus, o evangelista que nos relata estes acontecimentos, mostra-se lacónico, como noutras ocasiões. Morto Herodes — escreve — o Anjo do Senhor apareceu em sonhos a José, no Egipto e disse-lhe: "Levanta-te, toma o Menino e Sua mãe, e vai para a terra de Israel; porque morreram os que procuravam tirar a vida ao Menino"[i].

A resposta do Patriarca foi imediata, como noutras ocasiões: Ele levantou-se, tomou o Menino e Sua mãe, e voltou para a terra de Israel[ii]. Nem uma dúvida, nem uma vacilação. Apenas o tempo necessário para recolher as ferramentas do seu ofício, os poucos bens de que dispunha. Ter-se-ia despedido das pessoas em cuja companhia tinha vivido aqueles meses e teria feito as diligências adequadas para empreender o regresso.

"ELE LEVANTOU-SE, TOMOU O MENINO E SUA MÃE E VOLTOU PARA A TERRA DE ISRAEL"[iii].

NEM UMA DÚVIDA, NEM UMA VACILAÇÃO. APENAS O TEMPO NECESSÁRIO PARA RECOLHER AS FERRAMENTAS DO SEU OFÍCIO, OS POUCOS BENS DE QUE DISPUNHA.

As tradições coptas indicam que a Sagrada Família fez a viagem de regresso por via marítima, e não por terra. É uma hipótese provável. Uma vez terminado o perigo, este caminho era mais económico e oferecia menos privações do que os trilhos das caravanas terrestres. Provavelmente partiram nalguma das numerosas embarcações que sulcavam o Nilo a partir de Menfis (actualmente Cairo) até Alexandria, onde apanhariam um pequeno barco que, em quatro ou cinco dias, navegando próximo da costa do Mediterrâneo, atracava em Ascalón, Joppe ou Yamnia.

Ao desembarcar, José recolheu informações sobre o novo rei da Judeia. Era Arquelau, filho de Herodes, e quase tão cruel como o pai, pois acabava de decapitar vários milhares de súbditos no próprio Templo. Num primeiro momento, o esposo de Maria tinha pensado estabelecer-se em Belém, lugar do nascimento do Messias; mas como o anjo não tinha indicado nada de concreto — tinha-lhe dito somente que regressasse à terra de Israel — encarou a possibilidade de ir para um lugar que não estivesse sujeito à jurisdição do rei. O Senhor confirmou-o nos seus propósitos por intermédio de um anjo: ouvindo dizer que Arquelau reinava na Judeia (...), teve medo de ir para lá; e, avisado por Deus em sonhos, retirou-se para a região da Galileia[iv]. Se a profecia de Miqueias tinha anunciado o nascimento de Jesus em Belém, outros oráculos — como São Mateus indica— designavam Nazaré como o lugar onde o Messias havia de crescer e chegar à idade adulta. E foi habitar numa cidade chamada Nazaré, cumprindo-se deste modo o que tinha sido anunciado pelos profetas: "Será chamado nazareno"[v].

A viagem de regresso foi tranquila e repousada, em etapas curtas. Podemos imaginar a emoção da Virgem e do seu Esposo quando, ao atravessar a planície de Esdrelón, já na Galileia, foram descobrindo os locais que lhes eram familiares, nos quais tinham decorrido os anos da sua meninice e adolescência. Em Nazaré reencontraram-se com parentes e amigos, que ficariam assombrados ao vê-los regressar depois de tantos meses sem terem notícias deles. Não faltariam as perguntas embaraçosas, motivadas pelo carinho e uma sã curiosidade, a que responderiam com descrição, para não revelar a verdade sobre Jesus que só eles guardavam no coração.

ERA UMA FAMÍLIA EM QUE O AMOR A DEUS E AOS OUTROS SE IDENTIFICAVA COM OS CUIDADOS QUE DISPENSAVAM A JESUS, VERBO ETERNO DO PAI.

Instalaram-se numa pequena casa, uma construção pobre contígua a uma das grutas tão frequentes em Nazaré. Talvez a encontrassem em mau estado, depois de tanto tempo sem estar habitada, mas não se lamentaram: imediatamente puseram mãos à obra. José reparou-a do melhor modo possível, Maria limpou-a com cuidado, talvez ajudada por Maria de Cléofas, sua prima, mãe de Santiago e de José, de Simão e de Judas e de outras pessoas da família.

A vida e o trabalho da Sagrada Família retomaram o seu ritmo quotidiano, sem nenhum acontecimento especial digno de referência. São Lucas, que a partir deste momento retoma a sua narração, refere secamente que o Menino crescia e fortificava-Se cheio de sabedoria, e a graça de Deus estava com Ele[vi]. A Virgem Santíssima, como todas as mães, seguia com olhar amoroso o crescimento humano do seu Filho e Senhor, cheia de admiração diante da naturalidade do modo de agir de Deus. José trabalhava com empenho, agradecido de servir com o seu trabalho o mistério da Redenção. Era uma família em que o amor a Deus e aos outros se identificava com os cuidados que dispensavam a Jesus, Verbo eterno do Pai, que aprendia a falar com palavras humanas e a amar com coração de homem.

j.a. loarte

A VOZ DO MAGISTÉRIO

Depois da morte de Herodes, quando se dá o retorno da sagrada família a Nazaré, inicia-se o longo período da vida oculta. Aquela que "acreditou no cumprimento das coisas que lhe foram ditas da parte do Senhor" [vii] vive no dia-a-dia o conteúdo dessas palavras. O Filho a quem deu o nome de Jesus está diariamente ao seu lado; assim, no contacto com Ele, usa certamente este nome, o que não devia, aliás, causar estranheza a ninguém, tratando-se de um nome que era usual, desde havia muito tempo, em Israel. Maria sabe, no entanto, que aquele a quem foi posto o nome de Jesus, foi chamado pelo Anjo "Filho do Altíssimo"[viii]. Maria sabe que o concebeu e deu à luz "sem ter conhecido homem", por obra do Espírito Santo, com o poder do Altíssimo que sobre ela estendeu a sua sombra[ix], tal como nos tempos de Moisés e dos antepassados a nuvem velava a presença de Deus[x]). Maria sabe, portanto, que o Filho, por ela dado à luz virginalmente, é precisamente aquele "Santo", "o Filho de Deus" de que lhe havia falado o Anjo.

Durante os anos da vida oculta de Jesus na casa de Nazaré, também a vida de Maria "está escondida com Cristo em Deus" [xi] mediante a fé. A fé é, efectivamente, um contacto com o mistério de Deus. Maria está constante e quotidianamente em contacto com o mistério inefável de Deus que se fez homem, mistério que supera tudo aquilo que foi revelado na Antiga Aliança. Desde o momento da Anunciação, a mente da Virgem-Mãe foi introduzida na "novidade" radical de auto-revelação de Deus e tomou consciência do mistério. Ela é a primeira daqueles "pequeninos" dos quais um dia Jesus dirá: "Pai, ... escondeste estas coisas aos sábios e aos sagazes e as revelaste aos pequeninos"[xii]. Na verdade, "ninguém conhece o Filho senão o Pai"[xiii].

Como poderá então Maria "conhecer o Filho"? Certamente, não como o Pai o conhece; e no entanto, ela é a primeira entre aqueles aos quais o Pai "o quis revelar"[xiv]. Se, porém, desde o momento da Anunciação lhe foi revelado o Filho, que apenas o Pai conhece completamente, como Aquele que o gera no "hoje" eterno[xv], então Maria, a Mãe, está em contacto com a verdade do seu Filho somente na fé e mediante a fé! Portanto, é feliz porque "acreditou"; e acredita cada dia, no meio de todas as provações e contrariedades do período da infância de Jesus e, depois, durante os anos da sua vida oculta em Nazaré, quando ele "lhes era submisso"[xvi]: submisso a Maria e também a José, porque José, diante dos homens, fazia para ele as vezes de pai; e era por isso que o Filho de Maria era tido pela gente do lugar como "o filho do carpinteiro"[xvii].

A Mãe daquele Filho, por conseguinte, lembrando tudo quanto lhe tinha sido dito na Anunciação e nos acontecimentos sucessivos, é portadora em si mesma da "novidade" radical da fé: o início da Nova Aliança. Este é o início do Evangelho, isto é, da boa nova e jubilosa nova. Não é difícil, porém, perceber naquele início um particular aperto do coração, unido a uma espécie de "noite da fé" - para usar as palavras de São João da Cruz - como que um "véu" através do qual é forçoso aproximar-se do Invisível e viver na intimidade com o mistério[xviii]. Foi deste modo, efectivamente, que Maria, durante muitos anos, permaneceu na intimidade com o mistério do seu Filho, e avançou no seu itinerário de fé, à medida que Jesus "crescia em sabedoria... e graça, diante de Deus e dos homens"[xix]. Manifestava-se cada vez mais aos olhos dos homens a predilecção que Deus tinha por ele. A primeira entre estas criaturas humanas admitidas à descoberta de Cristo foi Maria que, com Ele e com José, vivia na mesma casa em Nazaré.

são joão paulo ii (século XX). Carta encíclica Redemptoris Mater, 25-III-1987, n. 17.

***

«Nazaré é a escola onde começa a entender-se a vida de Jesus, é a escola onde se inicia o conhecimento do Seu Evangelho. Aqui aprendemos a observar, a escutar, a meditar, a penetrar no sentido profundo e misterioso desta simples, humilde e encantadora manifestação do Filho de Deus entre os homens. Aqui se aprende inclusivamente, talvez de uma maneira quase insensível, a imitar essa vida.

Aqui revela-se-nos o método que nos fará descobrir quem é Cristo. Aqui compreendemos a importância que tem o ambiente que rodeou a Sua vida durante a Sua estadia entre nós, e quão necessário é o conhecimento dos lugares, dos tempos, dos costumes, da linguagem, das práticas religiosas, numa palavra, de tudo aquilo de que Jesus se serviu para Se revelar ao mundo. Aqui tudo fala, tudo tem um sentido.

Aqui, nesta escola, compreendemos a necessidade de uma disciplina espiritual se queremos seguir os ensinamentos do Evangelho e ser discípulos de Cristo. Como gostaríamos de ser outra vez crianças e voltar a esta humilde mas sublime escola de Nazaré! Como gostaríamos de voltar a começar, junto de Maria, a nossa iniciação na verdadeira ciência da vida e na mais elevada sabedoria da verdade divina! (...).

A Sua primeira lição é o silêncio. Como desejaríamos que se renovasse e fortalecesse em nós o amor ao silêncio, esse admirável e indispensável hábito do espírito, tão necessário para nós, que estamos atordoados por tanto ruído, tanto tumulto, tantas vozes da nossa ruidosa e extremamente agitada vida moderna. Silêncio de Nazaré, ensina-nos o recolhimento e a interioridade, ensina-nos a estar sempre dispostos a escutar as boas inspirações e a doutrina dos verdadeiros mestres. Ensina-nos a necessidade e o valor de uma conveniente formação, do estudo, da meditação, de uma vida interior intensa, da oração pessoal que só Deus vê.

Oferece-se-nos, além disso, uma lição de vida familiar. Que Nazaré nos ensine o significado da família, a sua comunhão de amor, a sua simples e austera beleza, o seu carácter sagrado e inviolável, o doce e insubstituível que é a sua pedagogia e o fundamental e incomparável que é a sua função no plano social.

Finalmente, aqui aprendemos também a lição do trabalho. Nazaré, a casa do filho do artesão: como desejamos compreender mais neste lugar a austera mas redentora lei do trabalho humano e exaltá-la devidamente, restabelecer a consciência da sua dignidade, de maneira que fosse patente para todos; recordar aqui, sob este tecto, que o trabalho não pode ser um fim em si mesmo e que a sua dignidade e a liberdade para o exercer não provêm tão só dos seus motivos económicos, mas também daqueles outros valores que o encaminham para um fim mais nobre».

beato paulo vi (século XX). Alocução em Nazaré, 5-I-1964

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A VOZ DOS PADRES DA IGREJA

«Convém meditar nas palavras que se seguem. Diz: "Crescia em sabedoria e graça"[xx]. Crescer em sabedoria e graça não pertence à natureza divina: desde o princípio tinha tudo e nada lhe faltava. Mas também não há que pensar que, segundo a natureza humana, [Jesus] se fortaleceu mais ou foi mais cheio daquele Espírito Santo que habitava n’Ele, pois desde o primeiro momento teve o supremo grau de inabitação da graça. Com efeito, mediante a união das duas naturezas, imediatamente "n’Ele habita, corporalmente, toda a plenitude da divindade"[xxi], como afirma o santo Apóstolo Paulo.

Assim, as palavras: "Crescia em sabedoria e graça"[xxii], ensinam que desde o primeiro momento da inabitação da humanidade na divindade, a plenitude de graça e de sabedoria se manifestava e resplandecia cada vez mais, de acordo com o desenvolvimento e o crescimento corporal; não recebia uma nova graça ou uma sabedoria superabundante, mas a plenitude de graça e de sabedoria manifestava-se por meio das Suas gloriosas acções (...). No entanto, não convinha que a Sua sabedoria se manifestasse fora da idade. E como, segundo a ordem da natureza, se requer esperar pelos doze anos para atingir a plenitude da razão, assim considerou Ele coisa boa atingi-la ao chegar aos doze anos».

são máximo o confessor (século VII). Vida de Maria, n. 60.

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«O Menino Jesus, que hoje nasceu para nós, cresce em sabedoria, idade e graça naqueles que O acolhem, mas em diversa medida. Não é idêntico em todos, mas adapta-Se à disponibilidade e à capacidade de cada um e, na medida em que é acolhido, mostra-Se como criança, como adolescente ou como adulto. É como um ramo na videira: não aparece sempre do mesmo modo, mas muda com o decorrer das estações; germina, floresce, converte-se em fruto, chega a fazer-se vinho.

A videira encerra já a promessa no fruto ainda não pronto para o vinho, mas aguarda a estação propícia. No entanto, não se pode dizer que o ramo esteja desprovido de atractivo. Em lugar de deleitar o gosto, deleita o olfacto; e na espera da vindima, fortalece o coração com a esperança. A fé firme e segura da graça que se espera é já gozo para quem aguarda com paciência. Assim sucede com a uva de Chipre: promete o vinho embora ainda não o seja. E com a sua flor (a flor é a esperança) dá garantias da graça futura. Quem adere plenamente mediante a sua vontade à lei do Senhor, e medita nela de dia e de noite, cresce como uma árvore frondosa regada por veias de água viva e produz fruto a seu tempo».

são gregório de nisa (século IV). Homilia II sobre o Cântico dos Cânticos (PG 44, 802-804).

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A VOZ DOS SANTOS


«S. Mateus, ao narrar estas cenas no seu Evangelho, põe constantemente em destaque a fidelidade de José, que cumpre sem vacilações os mandatos de Deus, embora por vezes o sentido desses mandatos lhe possa parecer obscuro ou se lhe oculte a sua conexão com o resto dos planos divinos.

A fé de José não vacila, a sua obediência é sempre estrita e rápida. Para compreender melhor esta lição que aqui nos dá o Santo Patriarca, é bom que consideremos que a sua fé é activa e que a sua obediência não se parece com a obediência de quem se deixa arrastar pelos acontecimentos. Porque a fé cristã é o que há de mais oposto ao conformismo ou à falta de actividade e de energia interiores.

José abandonou-se sem reservas nas mãos de Deus, mas nunca deixou de reflectir sobre os acontecimentos, e assim recebeu do Senhor a inteligência das obras de Deus, que é a verdadeira sabedoria.

Deste modo, aprendeu pouco a pouco que os planos sobrenaturais têm uma coerência divina, que às vezes está em contradição com os planos humanos.

Nas diversas circunstâncias da sua vida, o Patriarca não renuncia a pensar, nem se alheia da sua responsabilidade. Pelo contrário: põe toda a sua experiência humana ao serviço da fé. Quando volta do Egipto, ouvindo que Arquelau reinava na Judeia em vez de seu pai Herodes, temeu ir para lá. Aprendeu a mover-se dentro dos planos divinos e, como confirmação de que Deus quer o que ele pressentia, recebe a indicação de se retirar para a Galileia.

Assim foi a fé de S. José: plena, confiante, íntegra, manifestando-se numa entrega real à vontade de Deus, numa obediência inteligente. E, com a Fé, a Caridade, o Amor. A sua fé funde-se com o amor: com o amor de Deus que estava a cumprir as promessas feitas a Abraão, a Jacob, a Moisés; com o carinho de esposo para com Maria e com o carinho de pai para com Jesus. Fé e amor na esperança da grande missão que Deus, servindo-se também dele – um carpinteiro da Galileia – estava a começar no mundo: a redenção dos homens.»

são josemaria (século XX). Cristo que passa, n. 42.

* * *

A VOZ DOS POETAS

O infinito Menino vai crescendo,
e com garbo e graça sobre-humana
dá passinhos pela mão asiendo
à que pisa a imortal Diana;
dela para o justo José parte correndo,
e dos braços com que o universo aplana
asas fazendo, voa para o doce ninho
do terno coração do seu querido...

Pendendo alegre do amado colo,
e achando-Se seguro entre seus braços,
o rosto grave junta ao Seu belo,
premiando seus dulcíssimos abraços:

Talvez deixe os braços de Sua mãe,
e cheio de amoroso regozijo
por ver que tal favor a José agrade,
balbuciando com ele, pai! lhe disse.

Ele com afecto e com amor de pai
filho! lhe chama, sendo de Deus Filho;
encosta o seu rosto ao de escarlate e neve,
e das suas rosas o alento bebe.

Já o Menino Deus os alvos peitos deixa
ricos do seu alimento soberano,
e nos pés de ouro já com maior força,
e anda sem que ninguém Lhe dê a mão;
chora se vê que seu José se afasta,
e vendo-o voltar se alegra ufano;
e diz cheio de alegria:

"Pai, dê-nos o pão de cada dia"...

josé de valdivielso (siglos XVI-XVII). Vida, excelencias y muerte del glorioso Patriarca y Esposo de Nuestra Señora San José, canto XIX.









[i] Mt 2, 19-20
[ii] Mt 2, 21
[iii] MT 2, 21
[iv] Mt 2, 22
[v] Mt 2, 23
[vi] Lc 2, 40
[vii] Lc 1, 45
[viii] cf. Lc 1, 32
[ix] cf. Lc 1, 35
[x] cf. Ex 24, 16; 40, 34-35; 1 Rs 8, 10-12
[xi] cf. Col 3, 3
[xii] Mt 11, 25
[xiii] Mt 11, 27
[xiv] cf. Mt 11, 26-27; 1 Cor 2, 11
[xv] cf. Sl 2, 7
[xvi] Lc 2, 51
[xvii] Mt 13, 55
[xviii] cfr. Subida do Monte Carmelo, II, cap. 3, 4-6
[xix] Lc 2, 52
[xx] Lc 2, 40
[xxi] Col 2, 9
[xxii] Lc 2, 40

Tratado do verbo encarnado 130

Questão 21: Da oração de Cristo

Em seguida devemos tratar da oração de Cristo.

E nesta questão discutem-se quatro artigos:

Art. 1 — Se convinha a Cristo orar.
Art. 2 — Se a Cristo, considerado na sua sensibilidade, convinha orar.
Art. 3 — Se convinha a Cristo orar por si.
Art. 4 — Se a oração de Cristo sempre foi ouvida.

Art. 1 — Se convinha a Cristo orar.

O primeiro discute-se assim. — Parece que a Cristo não convinha o orar.

1. — Pois, como diz Damasceno, orar é pedir o que convém, a Deus. Ora, podendo Cristo fazer tudo, não lhe convém pedir nada a ninguém. Logo, parece que não convinha a Cristo o orar.

2. Demais. — Não devemos pedir, nas nossas orações, o que sabemos haver certamente de se dar, assim, não oramos para o sol nascer amanhã. Também não é conveniente pedir nas nossas orações o que sabemos que de nenhum modo se dará. Ora, Cristo sabia, em tudo, o que haveria de suceder. Logo, não lhe cabia pedir nada, pela oração.

3. Demais. — Damasceno diz que a oração é ascensão do nosso intelecto para Deus. Ora, o intelecto de Cristo não precisava ascender para Deus, com quem estava sempre unido, não só pela união hipostática mas também pela fruição da bem-aventurança. Logo, a Cristo não convinha orar.

Mas, em contrario, o Evangelho: Aconteceu naqueles dias que saiu ao monte a orar e passou toda a noite em oração a Deus.

Como dissemos na Segunda Parte, a oração é um como expandir-se da nossa vontade para com Deus, para que a satisfaça. Se, pois, Cristo tivesse uma só vontade – a divina, de nenhum modo lhe cabia orar, pois, a vontade divina faz por si mesma tudo quanto quer, segundo a Escritura: Quantas coisas quis todas fez o Senhor. Mas, tendo Cristo uma vontade divina e outra, humana, e não sendo a sua vontade humana capaz, por si mesma, de fazer o que quer, senão por virtude divina, daí vem que era natural a Cristo orar, enquanto homem e dotado de uma vontade humana.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Cristo, como Deus, podia fazer tudo o que queria, mas não como homem, pois, como tal, não tinha a omnipotência, como dissemos. Contudo ele quis, mesmo como homem e Deus, fazer oração ao Pai, não porque não fosse omnipotente, mas para nossa instrução. — Primeiro, para mostrar que vinha do Pai, sendo por isso que disse: Falei assim, isto e, orei por atender a este povo que está à roda de mim, para que eles creiam que tu me enviaste. Donde o dizer Hilário: Não precisava de orar, orou por nós, para que o Filho não fosse ignorado. — Segundo, para nos dar o exemplo da oração. E por isso diz Ambrósio: Não escuteis com ouvidos enganosos, pensando que o Filho de Deus orava, por fraqueza, pedindo se realizar o que não podia ele realizar. Mas, como fonte de todo poder, como mestre da obediência, ensina-nos, com o seu exemplo, os preceitos da virtude. Daí o dizer Agostinho: O Senhor podia, sob a forma de servo, e se o fosse necessário, orar em silêncio, mas quis apresentar-se ao Pai como pecador, para lembrar que era o nosso Mestre.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Entre as várias coisas futuras que Cristo sabia, sabia que algumas se realizariam mediante as suas orações. E essas não era inconveniente que as pedisse a Deus.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A ascensão não é mais que o movimento para o que está em cima. Ora, o movimento, conforme Aristóteles, é susceptível de duplo sentido. - Num sentido próprio implica a passagem a potência para o acto, enquanto é o acto do que é imperfeito. E assim, ascender é próprio do que é potencial, e não actual, em relação ao que está em cima. E neste sentido Damasceno diz: O intelecto humano de Cristo não precisava de ascender para Deus, pois, estava sempre unido com Deus, tanto pela sua existência pessoal, como pela contemplação beatífica. — Noutro sentido, o movimento é o acto do perfeito, isto é, do que existe em acto, e assim chamamos movimento ao inteligir e ao sentir. E neste sentido, o intelecto de Cristo sempre ascende para Deus, pois sempre o contemplava como o que tinha uma existência superior.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


Temas para meditar - 374

Tristeza



A tristeza exerce um efeito paralisante sobre a nossa fé.




(tadeus dajczer, Meditações sobre a Fé, Paulus, 4ª Ed., pg. 89)

Pequena agenda do cristão

SeGUNDa-Feira



(Coisas muito simples, curtas, objectivas)


Propósito:
Sorrir; ser amável; prestar serviço.

Senhor que eu faça ‘boa cara’, que seja alegre e transmita aos outros, principalmente em minha casa, boa disposição.

Senhor que eu sirva sem reserva de intenção de ser recompensado; servir com naturalidade; prestar pequenos ou grandes serviços a todos mesmo àqueles que nada me são. Servir fazendo o que devo sem olhar à minha pretensa “dignidade” ou “importância” “feridas” em serviço discreto ou desprovido de relevo, dando graças pela oportunidade de ser útil.

Lembrar-me:
Papa, Bispos, Sacerdotes.

Que o Senhor assista e vivifique o Papa, santificando-o na terra e não consinta que seja vencido pelos seus inimigos.

Que os Bispos se mantenham firmes na Fé, apascentando a Igreja na fortaleza do Senhor.

Que os Sacerdotes sejam fiéis à sua vocação e guias seguros do Povo de Deus.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?