25/03/2016

Dia 25 de Março de 2016

Hoje é Sexta-Feira Santa e comemoramos a Paixão e Morte do Senhor.

Mas, este ano, também comemoramos neste dia a Anunciação do Ar­canjo São Gabriel à Santíssima Virgem.
Hoje começa a gerar-se no seu puríssimo seio este Jesus que agora se nos vai para uma morte ignominiosa.



Daqui exactamente a nove meses estaremos a comemorar o Seu Nas­cimento em Belém.

Neste Ano Jubilar da Misericórdia penso ser obrigatório pensar muito a sério na Morte, no Nascimento, na VIDA!


ama, 25.03.2016

Madrugada de Sexta-Feira Santa

Resultado de imagem para julgamento de jesus no sinédrioA esta hora em que escrevo esta meditação já é Sexta-Feira.

O Senhor acaba de sair da casa do Sumo-Sacerdote depois de ser su­jeito a um simulacro de julgamento sem qualquer base sólida de acu­sação nem direito a contestação.
Várias “testemunhas” acusam e inventam, inventam e acusam.
Como numa peça de teatro medíocre os actores prestam-se a desem­penhos lamentáveis.

Jesus é atacado na Sua honra, no Seu bom-nome, na Sua dignidade.
Mas cala-se, não se defende, não reage.

Está triste e abatido, acabou de ouvir cá fora, no páteo, Pedro – o Seu Cefas – a jurar que não O conhecia.
Está ansioso por sair dali para lhe lançar um olhar sereno e amigo que fará o pobre Pedro debulhar-se em lágrimas.

Acabando com o “teatro medíocre” o Sumo-Sacerdote tem um gesto teatral que, pensa ele, é definitivo: rasga as vestes.
Até este acto é falso porque as vestimentas têm um lugar especial para serem rasgadas, mas isso não importa, é assim mesmo e todos sabem que tal significa o reconhecimento da ”gravidade das culpas” assacadas ao prisioneiro.

A partir daqui tudo se precipita num crescendo de violências, desaca­tos, faltas de respeito. O Senhor é levado aos empurrões, com uma corda ao pescoço através das vielas da cidade em direcção ao Pretório de Pilatos.

Sinto-me chocado com estas cenas e não aceito que o meu Senhor, o meu Jesus, seja tratado assim.

Não culpo os “juízes”, os Seus inimigos porque não posso; Ele dirá no alto da Cruz: «Pai perdoa-lhes porque não sabem o que fazem».

Culpo-me a mim que sei muito bem o que faço e com as minhas misé­rias e pecados sem conta o “obriguei” a passar por este transe.
Ele quis salvar-me, desejou que fosse Seu seguidor e partilhasse com Ele a vida eterna.

E… tenho de aceitar, tal como Ele aceitou, esta dor e remorso de ser como sou, de “fazer o mal que não quero e não fazer o bem que quero”.

E, aceitando rendidamente a Vontade do meu Senhor, seco as minhas lágrimas e vou pelo que resta da noite, procurar a Santíssima Virgem.

Quero estar com ela, aninhar-me nos seus braços e dizer-lhe que a amo muito, muito, muito.

Ah! E pedir-lhe que me abençoe e que me leve por um caminho seguro [1] o resto dos dias que me for concedido viver, para me encontrar final­mente com o seu querido Filho, o meu Irmão Jesus.

AMA, 25 Mar 2016


[1] Iter para tuto

Publicações Mar 25


São Josemaria - Textos

São Jerónimo, Vida Eterna

AMA - Via-Sacra

AMA - Comentários ao Evangelho Jo 18 1 19-42, Confissões - Santo Agostinho

CIC – Compêndio

Bento XVI - Pensamentos espirituais

Suma Teológica - Tratado da Vida de Cristo - Do género de vida que Cristo levou - Quest 44 Art. 1, São Tomás de Aquino – Suma Teológica

AT - Salmos – 144


Agenda Sexta-Feira

Cristo na Cruz

Cristo na Cruz, Deus que sofre e que morre, Deus que nos entrega o seu Coração, aberto por uma lança, por amor a todos. Nosso Senhor abomina as injustiças e condena quem as comete. Mas, como respeita a liberdade das pessoas, permite que existam. Deus Nosso Senhor não causa a dor das criaturas, mas tolera-a como parte que é – depois do pecado original – da condição humana. E, no entanto, o seu Coração, cheio de amor pelos homens, levou-O a tomar sobre os seus ombros, juntamente com a Cruz, todas essas torturas: o nosso sofrimento, a nossa tristeza, a nossa angústia, a nossa fome e sede de justiça.

A doutrina cristã sobre a dor não é um programa de fáceis consolações. Começa logo por ser uma doutrina de aceitação do sofrimento, inseparável de toda a vida humana. Não vos posso esconder – e com alegria pois sempre preguei e procurei viver a verdade de que, onde está a Cruz está Cristo, o Amor – que a dor apareceu muitas vezes na minha vida; e mais de uma vez tive vontade de chorar. Noutras ocasiões, senti crescer em mim o desgosto pela injustiça e pelo mal. E soube o que era a mágoa de ver que nada podia fazer, que, apesar dos meus desejos e dos meus esforços, não conseguia melhorar aquelas situações iníquas.

Quando vos falo de dor, não vos falo apenas de teorias. Nem me limito a recolher uma experiência de outros, quando vos confirmo que, se sentis, diante da realidade do sofrimento, que a vossa alma vacila algumas vezes, o remédio que tendes é olhar para Cristo. A cena do Calvário proclama a todos que as aflições hão-de ser santificadas, se vivermos unidos à Cruz.

Porque as nossas tribulações, cristãmente vividas, se convertem em reparação, em desagravo, em participação no destino e na vida de Jesus, que voluntariamente experimentou, por amor aos homens, toda a espécie de dores, todo o género de tormentos. Nasceu, viveu e morreu pobre; foi atacado, insultado, difamado, caluniado e condenado injustamente; conheceu a traição e o abandono dos discípulos; experimentou a solidão e as amarguras do suplício e da morte. Ainda agora, Cristo continua a sofrer nos seus membros, na Humanidade inteira que povoa a Terra e da qual Ele é Cabeça e Primogénito e Redentor.

A dor entra nos planos de Deus. Ainda que nos entendê-la, é esta a realidade. Também Jesus, como homem, teve dificuldade em admiti-la: Pai, se é possível, afasta de Mim este cálice! Não se faça, porém, a minha vontade, mas a tua! Nesta tensão entre o sofrimento e a aceitação da vontade do Pai, Jesus vai serenamente para a morte, perdoando aos que O crucificaram.


Ora, esta aceitação sobrenatural da dor pressupõe, por outro lado, a maior conquista. Jesus, morrendo na Cruz, venceu a morte. Deus tira da morte a vida. A atitude de um filho de Deus não é a de quem se resigna à sua trágica desventura; é, sim, a satisfação de quem já antegoza a vitória. Em nome desse amor vitorioso de Cristo, nós, os cristãos, devemos lançar-nos por todos os caminhos da Terra, para sermos semeadores de paz e de alegria, com a nossa palavra e nossas obras. Temos de lutar – é uma luta de paz – contra o mal, contra a injustiça, contra o pecado, para proclamarmos assim que a actual condição humana não é a definitiva; o amor de Deus, manifestado no Coração de Cristo, conseguirá o glorioso triunfo espiritual dos homens. (Cristo que passa, 168)

VIA - SACRA - Posfácio

posfácio

Chegou ao fim a fantástica e sublime odisseia da Paixão e Morte de Jesus Cristo, meu Salvador.

Por momentos, aos meus olhos e coração humanos, parecem-me excessivos os desígnios de Deus: tanto sofrimento, tamanha dor!

Porque me esqueço da suma gravidade e horrível falta que é o pecado dos homens.

Que outra reparação seria possível ou completa senão a levada a cabo pelo próprio Ofendido?

Que és Deus fica abundantemente provado pelo Amor e Misericórdia infinitas que nesta Paixão se revelam.

Que tenhas querido, com esta Paixão, considerar-me Teu filho e devolvido a Eternidade é o que eu acredito firmemente. Ajuda-me Senhor, a ter sempre presentes as cenas que acabo de meditar para que, a sua lembrança bem viva no meu coração me impeça de Te magoar e ofender.[1]

oratória

vultum tuum


Ajuda-me Senhor, a aceitar a minha morte, como e quando Tu o desejares.

Que eu me prepare, Senhor, todos os dias que me concederes viver, para esse momento solene.

Que me encontres disposto e pronto, a qualquer momento, para corresponder à Tua chamada.

Que possa com supremo júbilo ouvir-te dizer que estarei contigo no Paraíso.

Que seja esse momento o verdadeiro encontro entre amigos verdadeiros dando corpo àquele grito que sinto subir-me do peito:

Vultum Tuum, Domine, requiram![2] [3]
filiação divina


Teu filho, Senhor meu Deus!

Que admiração me causa esta realidade.

Que espanto me invade a ponto de só a minha Fé a manter viva em mim.

Podendo eu o que posso:

Nada!

Sendo eu que sou: 

Nada!

Tendo eu o que tenho:

Nada!

Sabendo eu o que sei:

Nada!

Valendo eu o que valho:

Nada!

Para que me queres Tu, Senhor?!

Que Te pode importar a minha pessoa?

Oh Senhor Deus, Rei dos Reis, Criador e Senhor de todas as coisas!

Como é grande o Teu Coração de Pai visto que nele caibo eu também.

Dou-Vos graças meu Senhor e meu Deus por tão grande favor e peço-te me ajudes a merecê-lo.[4]

in hora mortis meae


Esta cruz tão pesada que por vezes permites carregue os meus ombros, é, bem o sei, um sinal do Teu amor por mim.


Se é verdade, Senhor, que, por vezes, provas mais aqueles que amas, então, estou feliz porque, seguramente, me tens junto ao Teu Coração Amantíssimo.

Não permitas, meu Deus, que me deixe esmagar pelo seu peso que, eu tenho a certeza, é à minha medida e muito menor que o que mereceria.

Mas, não Te esqueças, como sou fraco e pusilânime, como me desvio do caminho e tento libertar-me; sou assim, bem o sabes, e sem a Tua ajuda não conseguirei.

A mim, meu Senhor, só me interessa cumprir a Tua Amabilíssima e Justíssima Vontade sobre todas as coisas, estar pronto para Te ver quando entenderes chamar-me a prestar contas.

Por isso, repito na minha alma o clamor que meu querido irmão Manuel José nos últimos tempos da sua vida terrena elevava para Ti:

In hora mortis meae voca me, et iube me venire ad Te.[5]


Os homens são quase sempre os carpinteiros das suas próprias cruzes. [6]



Esta cruz que tento levar a prumo, desafiando as minhas fraquezas, a minha fraca vontade, a minha fuga à dor, esta cruz, Senhor, é a cruz da minha vida que Tu queres que eu leve.
       
Foi talhada por mim, só por mim: as minhas faltas, os meus desejos de ter e possuir, a minha vontade fraca, os devaneios, a falta de unidade de vida, tudo isso e muito mais fui juntando alheadamente e, o resultado... é este.

E agora! Sim... e agora!

Como conseguirei levá-la?

Como conseguirei levá-la a prumo, bem erguida ao alto?

Como hei-de fazer para não me queixar, não me rebelar contra esta cruz que me pesa...pesa?

Senhora das Dores, olha para este teu filho que, gemendo e chorando neste vale de lágrimas, vai arrastando penosamente a sua pequena cruz, e diz ao teu Divino Filho, que eu..., sou pobre e fraco, pequeno e débil, e que preciso de ajuda.

Com essa ajuda divina que, tenho a certeza, me será concedida, não pelos meus méritos mas pela largueza da Sua misericórdia, poderei então levar esta cruz sem medo ou repugnância e oferecer-lhe o esforço da luta que para tal, sem descanso, travarei.[7]

omnia in bonum

Será assim, Senhor, queres-me mais, desejas mais de mim e por isso permites todas estas coisas que me têm acontecido: a perda de emprego, as dificuldades económicas, a perda da honra e do bom-nome, a injustiça, a doença grave e as suas dores e limitações e, também, as minhas fraquezas, a minha sensualidade, o meu mau humor e todas as debilidades de que me envergonho tanto?

Será assim, Senhor?

Então: Omnia in bonum!

Ajuda-me a aceitar, a fazer boa cara, a ganhar coragem e sair para a frente. [8]



 * * * *







[1] Porto, Quaresma de 1987
[2] Sal. 26
[3] Porto, Semana Santa de 99
[4] Porto, 2000.05.17
[5] Porto, Quaresma de 2001
[6] S. Filipe de Néri, Máximas
[7] Porto, Quaresma de 2005
[8] AMA, Diário, Porto, 09.08.2002 e 01.01.2008

Evangelho, comentário, L. espiritual


Quaresma

Semana Santa

Evangelho: Jo 18, 1-19. 42

1 Tendo Jesus dito estas palavras, saiu com os Seus discípulos para o outro lado da torrente do Cédron, onde havia um horto, em que entrou com os Seus discípulos. 2 Ora Judas, o traidor, conhecia bem este lugar, porque Jesus tinha ido lá muitas vezes com os Seus discípulos. 3 Tendo, pois, Judas tomado a coorte e guardas fornecidos pelos pontífices e fariseus, foi lá com lanternas, archotes e armas. 4 Jesus, que sabia tudo que estava para Lhe acontecer, adiantou-Se e disse-lhes: «A quem buscais?». 5 Responderam-Lhe: «A Jesus de Nazaré». Jesus disse-lhes: «Sou Eu». Judas, que O entregava, estava lá com eles. 6 Quando, pois, Jesus lhes disse: «Sou Eu», recuaram e caíram por terra. 7 Perguntou-lhes novamente: «A quem buscais?». Eles disseram: «A Jesus de Nazaré». 8 Jesus respondeu: «Já vos disse que sou Eu; se é, pois, a Mim que buscais, deixai ir estes». 9 Deste modo se cumpriu a palavra que tinha dito: «Não perdi nenhum dos que Me deste». 10 Simão Pedro, que tinha uma espada, puxou dela e feriu um servo do Sumo-sacerdote, tendo-lhe cortado a orelha direita. Este servo chamava-se Malco. 11 Porém, Jesus disse a Pedro: «Mete a tua espada na bainha. Não hei-de beber o cálice que o Pai Me deu?». 12 Então, a coorte, o tribuno e os guardas dos judeus prenderam Jesus e O manietaram. 13 Primeiramente levaram-n'O a casa de Anás, por ser sogro de Caifás, que era o Sumo Sacerdote daquele ano. 14 Caifás era aquele que tinha dado aos judeus este conselho: «Convém que um só homem morra pelo povo». 15 Simão Pedro e um outro discípulo seguiam Jesus. Este discípulo, que era conhecido do pontífice, entrou com Jesus no pátio do pontífice. 16 Pedro ficou de fora, à porta. Saiu então o outro discípulo que era conhecido do Sumo Sacerdote, falou à porteira e fez entrar Pedro. 17 Então a porteira disse a Pedro: «Não és tu também dos discípulos deste homem?». Ele respondeu: «Não sou». 18 Os servos e os guardas acenderam uma fogueira e aqueciam-se ao lume, porque estava frio. Pedro encontrava-se também entre eles e aquecia-se. 19 Entretanto, o pontífice interrogou Jesus sobre os Seus discípulos e sobre a Sua doutrina.20 Jesus respondeu-lhe: «Eu falei publicamente ao mundo; ensinei sempre na sinagoga e no templo, onde todos os judeus se reúnem; nada disse em segredo.21 Porque Me interrogas? Interroga aqueles que ouviram o que Eu falei; eles sabem o que disse». 22 Tendo dito isto, um dos guardas que estavam presentes deu uma bofetada em Jesus, dizendo: «Assim respondes ao Sumo-sacerdote?». 23 Jesus respondeu-lhe: «Se falei mal, mostra o que disse de mal; se falei bem, porque Me bates?». 24 Anás enviou-O manietado ao Sumo-sacerdote Caifás. 25 Estava lá Simão Pedro aquecendo-se. Disseram-lhe: «Não és tu também dos Seus discípulos?». Ele negou e respondeu: «Não sou». 26 Disse-lhe um dos servos do Sumo-sacerdote, parente daquele a quem Pedro cortara a orelha: «Não te vi eu com Ele no horto?». 27 Pedro negou outra vez, e imediatamente o galo cantou. 28 Levaram então Jesus da casa de Caifás ao Pretório. Era de manhã. Não entraram no Pretório para não se contaminarem, e poderem comer a Páscoa. 29 Pilatos, pois, saiu fora para lhes falar, e disse: «Que acusação apresentais contra este homem?». 30 Responderam: «Se não fosse um malfeitor não O entregaríamos nas tuas mãos». 31 Pilatos disse-lhes então: «Tomai-O e julgai-O segundo a vossa Lei». Mas os judeus disseram-lhe: «Não nos é permitido matar ninguém». 32 Para se cumprir a palavra que Jesus dissera, significando de que morte havia de morrer. 33 Tornou, pois, Pilatos a entrar no Pretório, chamou Jesus e disse-Lhe: «Tu és o rei dos judeus?». 34 Jesus respondeu: «Tu dizes isso por ti mesmo, ou foram outros que to disseram de Mim?». 35 Pilatos respondeu: «Porventura sou judeu? A Tua nação e os pontífices é que Te entregaram nas minhas mãos. Que fizeste Tu?». 36 Jesus respondeu: «O Meu reino não é deste mundo; se o Meu reino fosse deste mundo, certamente os Meus ministros se haviam de esforçar para que Eu não fosse entregue aos judeus; mas o Meu reino não é daqui». 37 Pilatos disse-Lhe então: «Portanto, Tu és rei?». Jesus respondeu: «Tu o dizes, sou rei. Nasci e vim ao mundo para dar testemunho da verdade; todo aquele que está na verdade ouve a Minha voz». 38 Pilatos disse-Lhe: «O que é a verdade?». Dito isto, tornou a sair para ir ter com os judeus e disse-lhes: «Não encontro n'Ele motivo algum de condenação. 39 Ora é costume que eu, pela Páscoa, vos solte um prisioneiro; quereis, pois, que vos solte o rei dos judeus?». 40 Então gritaram todos novamente: «Este não, mas Barrabás!». Ora Barrabás era um assassino.
1 Pilatos tomou então Jesus e mandou-O flagelar. 2 Depois, os soldados, tecendo uma coroa de espinhos, puseram-Lha sobre a cabeça e revestiram-n'O com um manto de púrpura. 3 Aproximavam-se d'Ele e diziam-Lhe: «Salve, rei dos judeus!», e davam-Lhe bofetadas. 4 Saiu Pilatos ainda outra vez fora e disse-lhes: «Eis que vo-l'O trago fora, para que conheçais que não encontro n'Ele crime algum». 5 Saiu, pois, Jesus, trazendo a coroa de espinhos e o manto de púrpura. Pilatos disse-lhes: «Eis aqui o Homem!». 6 Então os príncipes dos sacerdotes e os guardas, quando O viram, gritaram: «Crucifica-O, crucifica-O!». Pilatos disse-lhes: «Tomai-O e crucificai-O, porque eu não encontro n'Ele motivo algum de condenação». 7 Os judeus responderam-lhe: «Nós temos uma Lei e, segundo essa Lei, deve morrer, porque Se fez Filho de Deus». 8 Pilatos, tendo ouvido estas palavras, temeu ainda mais. 9 Entrou novamente no Pretório e disse a Jesus: «Donde és Tu?». Mas Jesus não lhe deu resposta. 10 Então Pilatos disse-Lhe: «Não me falas? Não sabes que tenho poder para Te soltar e também para Te crucificar?». 11 Jesus respondeu: «Tu não terias poder algum sobre Mim, se não te fosse dado do alto. Por isso, quem Me entregou a ti tem maior pecado». 12 Desde este momento, Pilatos procurava soltá-l'O. Porém, os judeus gritavam: «Se soltas Este, não és amigo de César!, porque todo aquele que se faz rei, declara-se contra César». 13 Pilatos, tendo ouvido estas palavras, conduziu Jesus para fora e sentou-se no seu tribunal, no lugar chamado Litóstrotos, em hebraico Gábata. 14 Era o dia da Preparação da Páscoa, cerca da hora sexta. Pilatos disse aos judeus: «Eis o vosso rei!». 15 Mas eles gritaram: «Tira-O, tira-O, crucifica-O!». Pilatos disse-lhes: «Hei-de crucificar o vosso rei?». Os pontífices responderam: «Não temos outro rei senão César». 16 Então entregou-Lho para que fosse crucificado. 17 Tomaram, pois, Jesus que, carregando com a Sua cruz, saiu para o lugar chamado Calvário, em hebraico Gólgota, 18 onde O crucificaram, e com Ele outros dois, um de cada lado, e Jesus no meio. 19 Pilatos redigiu um título, que mandou colocar sobre a cruz. Nele estava escrito: «Jesus Nazareno, Rei dos Judeus». 20 Muitos judeus leram este título, porque o lugar onde foi crucificado ficava perto da cidade. Estava redigido em hebraico, em latim e em grego. 21 Os pontífices dos judeus diziam, porém, a Pilatos: «Não escrevas: Rei dos Judeus, mas: Este homem disse: Eu sou o Rei dos Judeus». 22 Pilatos respondeu: «O que escrevi, está escrito!». 23 Os soldados, depois de terem crucificado Jesus, tomaram as Suas vestes e fizeram delas quatro partes, uma para cada soldado. Tomaram também a túnica. A túnica não tinha costura, era toda tecida de alto a baixo. 24 Disseram entre si: Não a rasguemos, mas lancemos sortes sobre ela, para ver a quem tocará; para que se cumprisse deste modo a Escritura, que diz: “Repartiram entre si as Minhas vestes e lançaram sortes sobre a Minha túnica”. “Os soldados assim fizeram. 25 Estavam, de pé, junto à cruz de Jesus, Sua mãe, a irmã de Sua mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena. 26 Jesus, vendo Sua mãe e, junto dela, o discípulo que amava, disse a Sua mãe: «Mulher, eis o teu filho». 27 Depois disse ao discípulo: «Eis a tua mãe». E, desde aquela hora, o discípulo recebeu-a na sua casa. 28 Em seguida, sabendo Jesus que tudo estava consumado, para se cumprir a Escritura, disse: «Tenho sede». 29 Havia ali um vaso cheio de vinagre. Então, os soldados, ensopando no vinagre uma esponja e atando-a a uma cana de hissopo, chegaram-Lha à boca. 30 Jesus, tendo tomado o vinagre, disse: «Tudo está consumado!». Depois, inclinando a cabeça, entregou o espírito. 31 Os judeus, visto que era o dia da Preparação, para que os corpos não ficassem na cruz no sábado, porque aquele dia de sábado era de grande solenidade, pediram a Pilatos que lhes fossem quebradas as pernas e fossem retirados. 32 Foram, pois, os soldados e quebraram as pernas ao primeiro e ao outro com quem Ele havia sido crucificado. 33 Mas, quando chegaram a Jesus, vendo que já estava morto, não Lhe quebraram as pernas, 34 mas um dos soldados trespassou-Lhe o lado com uma lança e imediatamente saiu sangue e água. 35 Quem foi testemunha deste facto o atesta, e o seu testemunho é digno de fé e ele sabe que diz a verdade, para que também vós acrediteis.36 Porque estas coisas sucederam para que se cumprisse a Escritura: “Não Lhe quebrarão osso algum”. 37 E também diz outro passo da Escritura: “Hão-de olhar para Aquele a quem trespassaram”. 38 Depois disto, José de Arimateia, que era discípulo de Jesus, ainda que oculto por medo dos judeus, pediu a Pilatos que lhe deixasse levar o corpo de Jesus. Pilatos permitiu-o. Foi, pois, e tomou o corpo de Jesus. 39 Nicodemos, aquele que tinha ido anteriormente de noite ter com Jesus, foi também, levando uma composição de quase cem libras de mirra e aloés. 40 Tomaram o corpo de Jesus e envolveram-n'O em lençóis com perfumes, segundo a maneira de sepultar usada entre os judeus. 41 Ora, no lugar em que Jesus foi crucificado, havia um horto e no horto um sepulcro novo, em que ninguém tinha ainda sido sepultado. 42 Por ser o dia da Preparação dos judeus e o sepulcro estar perto, depositaram ali Jesus.

Comentário:

Esta narrativa de São João é um testemunho de quem presenciou o que descreve.
É tão realista e ao mesmo tempo concisa que não podemos deixar de nos "meter" como "um personagem mais" como aconselhava São Josemaria.
E fica-se como que em suspenso das próximas cenas que se sucedem em ritmo quase alucinante.
Ao longo dos anos fomos lendo e meditando nestas passagens da Paixão quer nos Evangelhos quer em livros e escritos tão numerosos e tão profundos como é, por exemplo, Getsémani escrito por D. Javier Echevarría o actual Prelado do Opus Dei, mas não obstante encontramos sempre algo novo que nos chama  particularmente a atenção; uma frase, um detalhe, atitude ou comportamento que movem o nosso espírito para uma contemplação diferente mais rica e "forte".

Estamos perante um drama, sem dúvida, mas não uma tragédia.

Não assistimos a um "fim" mas a um "começo".

De facto com o fim da vida terrena de Jesus Cristo marca o começo da nossa vida como Filhos de Deus.

Por isso mesmo a alegria da Paixão se justifica  plenamente como a" alegria dos filhos de Deus".

(ama, Comentário sobre Jo 18 1 19-42, 2015.04.03, Sexta-Feira Santa, 15h00)

Leitura espiritual



SANTO AGOSTINHO - CONFISSÕES

CAPÍTULO X

A descoberta de Deus

Estimulado por estas leituras a voltar a mim mesmo, entrei, guiado por ti, no profundo do meu coração, e o pude fazer porque te fizeste minha ajuda. Entrei, e vi com os olhos da alma, acima desses mesmos olhos, acima da minha inteligência, a luz imutável; não esta vulgar e visível a todos os olhos de carne, nem outra do mesmo género, embora maior. Era muito mais clara e enchendo com a sua força todo o espaço. Não, não era esta luz, mas uma luz diferente de todas estas.

Ela não estava sobre o meu espírito como o azeite sobre a água, como o céu sobre a terra, mas estava acima de mim porque me criou; eu era-lhe inferior por ter sido criado por ela. Quem conhece a verdade conhece a luz, e quem a conhece, conhece a eternidade. O amor conhece-a!

Ó eterna verdade, amor verdadeiro, amada eternidade! Tu és o meu Deus. Por ti suspiro dia e noite. Quando te conheci pela primeira vez, ergueste-me para me fazer ver que havia algo para ser visto, mas que eu ainda era incapaz de ver. E deslumbraste a fraqueza da minha vista com o fulgor do teu brilho, e eu estremeci de amor e temor. Pareceu-me estar longe de ti numa região desconhecida, como se ouvira tua voz do alto: “Sou o pão dos fortes; cresce, e comer-me-ás. Não me transformarás em ti, como fazes com o alimento da tua carne, mas tu serás mudado em mim”.

E conheci então que “castigaste o homem por causa de sua iniquidade”, e “que secaste a minha alma como uma teia de aranha”, e eu disse: Porventura não existe a verdade, por não ser difusa pelos espaços finitos e infinitos? E tu gritaste-me de longe: Na verdade, Eu sou o que sou.

E eu ouvi como se ouve no coração, sem deixar motivo para dúvidas; antes, mais facilmente duvidaria da minha vida que da existência da verdade, que se manifesta à inteligência pelas coisas da criação.

CAPÍTULO XI

Deus e as criaturas

E contemplei as outras coisas que estão abaixo de ti, e vi que nem existem absolutamente, e nem absolutamente deixam de existir. Certamente existem, porque procedem de ti; mas não existem, pois, não são o que tu és, porque só existe verdadeiramente o que permanece imutável.

Com isso, para mim é bom apegar-me a Deus, porque, se não permanecer nele, tampouco poderei permanecer em mim. Ele, porém, permanecendo em si, renova todas as coisas, e tu és o meu Senhor, porque não necessitas dos meus bens.

CAPÍTULO XII

O mal e o bem da criação

Também pode entender que são boas as coisas que se corrompem. Se fossem sumamente boas, não poderiam corromper-se, como tampouco o poderiam se não fossem boas de algum modo. Com efeito, se fossem sumamente boas, seriam incorruptíveis; e se não tivessem nenhuma bondade, não haveria nelas nada que se pudesse corromper. Porque a corrupção é um mal, e não poderia ser nociva se não diminuísse o bem real. Logo, ou a corrupção é inofensiva, o que é impossível, ou, o que é certo, tudo o que se corrompe é privado de algum bem. E assim, se algo for privado de todo o bem, deixará totalmente de existir. E se algo subsistisse sem já poder ser corrompido, seria ainda melhor, porque permaneceria incorruptível. E haverá maior absurdo do que afirmar que uma coisa se torna melhor pela perda de todo o bem? Logo, ser privado de todo o bem é o nada absoluto. Donde se segue que, enquanto as coisas existem, elas são boas.

Portanto, tudo o que existe é bom; e o mal, cuja origem eu procurava, não é uma substância, porque se o fosse seria um bem. De facto, ou ele seria substância incorruptível, e portanto um grande bem; ou seria uma substância corruptível, que se não se poderia corromper se não fosse boa.

Vi pois, e foi para mim evidente, que tu eras o autor de todos os bens, e que não há em absoluto substância alguma que não tenha sido criada por ti. E como não as fizeste todas iguais, toas as coisas existem, porque cada uma por si é boa, e todas juntas muito boas, porque o nosso Deus fez todas as coisas muito boas.

CAPÍTULO XIII

Os louvores da criação

E para ti, Senhor, não existe absolutamente o mal; e nem para universalidade da tua criação; porque nada existe fora dela, capaz de romper ou de corromper a ordem que tu lhe impuseste. Todavia, em algumas das suas partes, determinados elementos não se harmonizam com outros, e estes são considerados maus. Mas, como esses mesmos elementos combinam com outros, são da mesma forma bons, e bons em si mesmos. E mesmo esses elementos que não concordam entre si se harmonizam com a parte inferior das criaturas que chamamos terra, com seu céu cheio de nuvens e de ventos, como lhe é conveniente.

Longe de mim dizer: Oxalá não existissem estas coisas! – Embora, considerando-as separadamente, eu as desejasse melhores, somente o facto de existirem deveria bastar para eu te louvar porque o proclamam os dragões da terra e todos os abismos; o fogo, o granizo, a neve, o vento da tempestade, que executam as tuas ordens; os montes e todas as colinas; as árvores frutíferas e todos os cedros; as feras e todos os gados; os répteis e todas as aves; os reis da terra e todos os povos; os príncipes e todos os juízes da terra, os jovens e as virgens, os anciões e as crianças; todos louvam teu nome.

Mas como também do alto dos céus é louvado, que seja louvado o nosso Deus, lá no alto por todos os teus anjos, todas as potestades, o sol e a lua, todas as estrelas e a luz, os céus dos céus, e a águas que estão sobre os céus glorificam o teu nome, eu já não desejava nada melhor, porque, considerando o todo, os elementos superiores pareciam-me sem dúvida melhores que os inferiores; mas um julgamento mais sadio fazia-me considerar o todo melhor que os elementos superiores tomados à parte.

CAPÍTULO XIV

Recapitulação

Não têm juízo sadio, nos que se desagradam com alguma parte da tua criação, como acontecia comigo, quando me desagradavam tantas das tuas obras. Mas, como a minha alma não se atrevia a desgostar o meu Deus, não queria considerar como obra tua o que lhe desagradava.

Por isso fora atrás da teoria das duas substâncias, na qual não achava descanso, e repetia coisas alheias. Desembaraçando-me desses erros, imaginara para si um Deus que se difundia pelos espaços infinitos e, julgando que eras tu, colocou-o no seu coração, e de novo se tornou o templo do seu ídolo, coisa abominável a teus olhos.

Mas, depois que afagaste a minha cabeça, sem que eu o percebesse, e fechaste os meus olhos para não vissem a vaidade, desprendi-me um pouco de mim mesmo, e a minha loucura adormeceu profundamente; quando despertei nos teus braços, vi que eras infinito não daquele modo, e esta visão não procedia da carne.

CAPÍTULO XV

Deus e a criação

Contemplei depois as outras coisas, e vi que te deviam a ti a sua existência, e que todas estão contidas em ti, não como num lugar material, mas de modo diferente: conservas todas elas na tua verdade, sustentadas na tua mão; todas as coisas são verdadeiras enquanto existem, e só é falso o que julgamos existir, mas não existe.

Também vi que cada coisa se adapta não só aos seus lugares, mas também aos seus tempos, e que tu, que és o único eterno, não começaste a agir depois de infinitos espaços de tempos, porque todos os espaços de tempo – passados ou futuros – não teriam passado nem viriam se tu não agistes e não fosses permanente.

CAPÍTULO XVI

Onde está o mal

Entendi por experiência que não é de admirar que o pão seja enjoativo ao paladar enfermo, mesmo tão agradável para o paladar sadio, e que olhos enfermos considerem odiosa a luz, que para os límpidos é tão cara. Se a tua justiça desagrada aos maus, muito mais desagradam a víbora e o caruncho, que criaste bons e adaptados à parte inferior da tua criação, com a qual também os maus se assemelham, tanto mais quanto mais diferem de ti, assim como os justos se assemelham às partes superiores do mundo na medida em que se assemelham a ti.

Indaguei o que era a iniquidade, e não achei substância, mas a perversão de uma vontade que se afasta da suprema substância, de ti, meu Deus – e se inclina para as coisas baixas, e que derrama as suas entranhas, e se intumesce exteriormente.

(Revisão de versão portuguesa por ama)