10/03/2017

Quaresma 2017 - prácticas básicas

Neste período que começou na Quarta-Feira de Cinzas e termina na Quarta-Feira da Semana Santa, somos convidados afazer o confronto especial entre as nossas vidas e a mensagem cristã expressa nos Evangelhos. Este confronto deve levar-nos a aprofundar a compreensão da Palavra de Deus e a intensificar a prática dos princípios essenciais da fé.
É um tempo de transformação, em que nos devemos exercitar espiritualmente para podermos melhorar. É um tempo de alegria, em que devemos estar atentos às oportunidades de mais amar.

Oração – para aprofundar e melhorar a minha relação com Deus. Trata-se de dar mais tempo e tempo de qualidade ao meu relacionamento com o Pai.
Esmola – para melhor amar e melhorar a minha relação com os outros. Estar atento aos que me rodeiam (Família, amigos, colegas de trabalho) e também aos que estão mais longe, mas que têm algum tipo de necessidades.
Jejum – para adquirir maior liberdade interior. Procurar as minhas dependências, aquelas que me limitam, afastam os outros, e tentar combatê-las.

Alguns exemplos destas três prácticas:

Oração
(como, quanto tempo, de que maneira)
Esmola
(ir ao encontro do outro de forma positiva)
Jejum
(libertar de manias, preconceitos, vícios)
Meditação
Ajudar financeiramente pessoas vítimas da actual crise
Abster-se de beber ou comer o que nos dá maior prazer.
Exame de consciência
Dar atenção a alguém
Televisão
Eucaristia
Ajudar instituições de cariz social
Determinado tipo de conversas
Reconciliação
Agradecer
Show off
Rezar o terço
Dizer coisas positivas
Comentar ou fazer juízos de valor sobre o próximo
Rezar pelos outros
Um sorriso
Evitar compras desnecessárias
Fazer silêncio no meu dia
Visitar um doente, um idoso.
Computador

E, no fim do dia, pensar em algo que fiz bem e em algo que poderia ter feito melhor.



(Síntese elaborada com base na Mensagem do Papa Francisco para a Quaresma de 2017)

Fátima: Centenário - Oração diária


Senhora de Fátima:

Neste ano do Centenário da tua vinda ao nosso País, cheios de confiança vimos pedir-te que continues a olhar com maternal cuidado por todos os portugueses.
No íntimo dos nossos corações instala-se alguma apreensão e incerteza em relação a este nosso País.

Sabes bem que nos referimos às diferenças de opinião que se transformam em desavenças, desunião e afastamento; aos casais desfeitos com todas as graves consequências; à falta de fé e de prática da fé; ao excessivo apego a coisas passageiras deixando de lado o essencial; aos respeitos humanos que se traduzem em indiferença e falta de coragem para arrepiar caminho; às doenças graves que se arrastam e causam tanto sofrimento.
Faz com que todos, sem excepção, nos comportemos como autênticos filhos teus e com a sinceridade, o espírito de compreensão e a humildade necessárias para, com respeito de uns pelos outros, sermos, de facto, unidos na Fé, santos e exemplo para o mundo.

Que nenhum de nós se perca para a salvação eterna.

Como Paulo VI, aqui mesmo em 1967, te repetimos:

Monstra te esse Matrem”, Mostra que és Mãe.

Isto te pedimos, invocando, uma vez mais, ao teu Dulcíssimo Coração, a tua protecção e amparo.


AMA, Fevereiro, 2017

Hoy el reto del amor es que no te avergüences de tu fe en Cristo

"EL BICHO RARO"

Ayer tuvimos garbanzos para comer. Mientras me servía no me di cuenta pero, al meterme una cucharada en la boca, ¡me había tocado el garbanzo negro! De repente me vino lo que se suele decir de "ser la oveja negra", y me vi sumergida en el evangelio de la oveja perdida, me vi apartando el garbanzo negro como si fuese la oveja que se pierde. Y recordé cómo Dios, que tiene una perspectiva mucho mayor, mira a la oveja perdida, manda a Cristo para ella, se abaja para buscarla y no para hasta que la encuentra y la salva.

Hoy puede que te sientas así, como la oveja negra, en tu familia, en tu trabajo... "el bicho raro". Te sientes rechazado, apartado por tener fe en el Dios que la sociedad rechaza hoy en día. Te preguntas qué haces ahí, en un ambiente tan hostil... incluso a veces ese ambiente te tira para abajo y hace que pierdas el Norte, que pierdas a Cristo.

El Señor viene a decirte que aproveches esa situación en la que estás y que Él permite para un bien mayor. Te puedes amargar por cada cara, por cada comentario, o puedes vivir el día de la mano del Señor y sentir cómo Él quiere que seas luz en medio de tu entorno. Hoy es el día de la Presentación de Jesús en el templo, el día de las Candelas... ¿dejarás que Él brille en ti?

Cristo no se separa de ti, Él está contigo y Él va a ir al trabajo contigo, a la compra, a la universidad... Jesús no es que pasase por un hombre muy cuerdo que digamos, Él fue rechazado en su propia ciudad, pero vino a ser la salvación de muchos. Me imagino las miradas que le echaban los fariseos y la gente que no estaba de acuerdo con Él, sin embargo, eso no hizo que dejase de anunciar el Reino de los Cielos, ni que dejase de amar. Hoy pídele su valentía.

Hoy el reto del amor es que no te avergüences de tu fe en Cristo, no te apartes, deja que Cristo vuelva a darte la fuerza para que, en medio del ruido, seas la paz, y no dejes de amar a cada persona que Él pone en tu camino, aunque no tenga la misma fe que tú. Él ama a cada uno infinitamente, pídele unos ojos nuevos para verlo.


VIVE DE CRISTO

Doutrina - 235

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA

Compêndio


PRIMEIRA PARTE: A PROFISSÃO DA FÉ
PRIMEIRA SECÇÃO: «EU CREIO» – «NÓS CREMOS»

CAPÍTULO SEGUNDO: DEUS VEM AO ENCONTRO DO HOMEM

A TRANSMISSÃO DA REVELAÇÃO DIVINA

15. A quem é confiado o depósito da fé?


O depósito da fé é confiado pelos Apóstolos a toda a Igreja. Todo o povo de Deus, mediante o sentido sobrenatural da fé, conduzido pelo Espírito Santo, e guiado pelo Magistério da Igreja, acolhe a Revelação divina, compreende-a cada vez mais e aplica-a à vida.

Epístolas de São Paulo – 10

Epístola de São Paulo aos Romanos

I . O EVANGELHO QUE NOS DÁ A SALVAÇÃO (1,18-11,36)

Capítulo 9

Incredulidade de Israel

1É verdade o que vou dizer em Cristo; não minto, pois é a minha consciência que, pelo Espírito Santo, disto me dá testemunho: 2tenho uma grande tristeza e uma dor contínua no meu coração. 3Desejaria ser amaldiçoado, ser eu próprio separado de Cristo, pelo bem dos meus irmãos, os da minha raça, segundo a carne. 4Eles são os israelitas, a quem pertence a adopção filial, a glória, as alianças, a lei, o culto, as promessas. 5A eles pertencem os patriarcas e é deles que descende Cristo, segundo a carne. Deus que está acima de todas as coisas, bendito seja Ele pelos séculos! Ámen.

Eleição dos patriarcas

6Não é que a palavra de Deus tenha falhado. O que acontece é que nem todos os que descendem de Israel são Israel, 7como nem todos, por serem descendentes de Abraão, são seus filhos.
Não: Só os de Isaac é que serão chamados a ser teus descendentes. 8O que significa que não são os filhos por via carnal que são filhos de Deus, mas só os filhos devido à promessa é que são tidos em conta como descendentes. 9É uma promessa, de facto, o que diz esta palavra: Voltarei por esta altura, e já Sara terá um filho.
10Não foi só com ela que isso aconteceu, mas também com Rebeca. Concebeu de um só homem, o nosso pai Isaac; 11e ainda os filhos não tinham nascido, nem nada de bom ou de mau tinham feito - para que se mantenha claro que o desígnio de Deus é da sua livre escolha 12e está dependente, não das obras, mas de Deus que chama - e já lhe foi dito:
O mais velho será servo do mais novo, 13de acordo com o que está escrito:
Amei Jacob, mas não Esaú.

Deus é livre na sua misericórdia

14Que havemos de concluir? Que há injustiça em Deus? De modo nenhum! 15É a Moisés que Ele o diz:
Usarei de misericórdia com quem me decido a ser misericordioso, e terei compaixão de quem me quero compadecer.
16Portanto, isto não depende daquele que quer nem daquele que se esforça por alcançá-lo, mas de Deus que é misericordioso. 17Assim, diz a Escritura ao Faraó: Exactamente para isto é que Eu te fiz surgir: para mostrar em ti o meu poder e para que assim o meu nome seja proclamado em toda a terra. 18Portanto, Deus usa de misericórdia com quem quer e endurece quem Ele quer.
19Dir-me-ás então: Nesse caso, de que me pode Ele repreender ainda? Sim, porque quem poderia resistir à sua vontade? 20Quem és tu, homem, para entrares em contestação com Deus? Dirá, porventura, o que é moldado àquele que o molda: «Porque me fizeste assim?» 21Ou não tem o oleiro poder sobre o barro para, da mesma massa, tanto fazer um vaso de luxo como um de uso vulgar?
22Ora, se Deus, na intenção de mostrar a sua ira e manifestar o seu poder, suportou com tanta paciência os vasos da ira, prontos para a perdição, 23e se Ele o fez também para manifestar a riqueza da sua glória para com os vasos da misericórdia que de antemão tinha preparado para a glória… 24A estes, que somos nós, chamou-os não só de entre os judeus, mas também de entre os gentios.
25É exactamente o que Ele diz no livro de Oseias:
Àquele que não é meu povo, hei-de chamar meu povo, e minha amada, àquela que não é minha amada.
26Precisamente no lugar onde lhes tinha sido dito:
«Vós não sois o meu povo», aí serão chamados filhos do Deus vivo.
27Isaías, por sua vez, exclama, a respeito de Israel: Ainda que o número dos filhos de Israel fosse como a areia do mar, só o resto se salvará; 28pois será de um modo completo e restrito que o Senhor há-de cumprir a sua palavra sobre a terra.
29É ainda o que profetizou Isaías:
Se o Senhor dos exércitos não nos tivesse deixado uma descendência, teríamos ficado como Sodoma, seríamos como Gomorra.

Israel tropeçou no Evangelho

30Que diremos, portanto? Que os gentios, que não procuravam a justiça, a alcançaram, mas, claro, a justiça que vem pela fé; 31Israel, ao contrário, que procurava uma lei que podia levar à justiça, não atingiu essa lei. 32Por que razão? Porque não foi pela fé, mas pelas obras, que a procuraram obter. Tropeçaram na pedra de tropeço, 33conforme o que está escrito:

Reparai que ponho em Sião uma pedra de tropeço, uma rocha de escândalo, e só quem nela acreditar não ficará frustrado.

Evangelho e comentário

Tempo da Quaresma


Evangelho: Mt 5, 20-26

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Se a vossa justiça não superar a dos escribas e fariseus, não entrareis no reino dos Céus. Ouvistes que foi dito aos antigos: ‘Não matarás; quem matar será submetido a julgamento’. Eu, porém, digo-vos: Todo aquele que se irar contra o seu irmão será submetido a julgamento. Quem chamar imbecil a seu irmão será submetido ao Sinédrio, e quem lhe chamar louco será submetido à geena de fogo. Portanto, se fores apresentar a tua oferta sobre o altar e ali te recordares que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa lá a tua oferta diante do altar, vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão e vem depois apresentar a tua oferta. Reconcilia-te com o teu adversário, enquanto vais com ele a caminho, não seja caso que te entregue ao juiz, o juiz ao guarda, e sejas metido na prisão. Em verdade te digo: Não sairás de lá, enquanto não pagares o último centavo».

Comentário:

Infelizmente há alguns cristãos que vão pela vida fora como actores.

Sim… não exagero!

Frequentam com assiduidade a Igreja e os Sacramentos, usam gran­diloquência sobre assuntos da religião, mas, privadamente, mantêm uma lista de agravos e reivindicações que aguardam ocasião para co­brar e fazer.

Ofensas antigas, más interpretações, juízos precipitados e malévolos e coisas do mesmo género de que se sentem credores quando, na maior parte das vezes, são eles mesmos os devedores.

Há que pôr as coisas em ordem e agir com critério em toda e qualquer circunstância que o cristão é-o sempre e não apenas quando é conve­niente.

(ama, comentário sobre Mt 5, 20-26, 2016.11.25)






Leitura espiritual

A CIDADE DE DEUS

Vol. 2

LIVRO IX

CAPÍTULO XIV

Sendo mortais, poderão os homens gozar da verdadeira felici­dade?

Se o homem poderá ser simultaneamente feliz e mortal — é a grande questão que entre os homens se põe. Alguns, olhando para a sua condição com demasiada modéstia, negaram ao homem a capacidade de ser feliz enquanto vive sujeito à mortalidade. Outros, considerando-
-se superiores, ousaram dizer que os mortais poderão ser felizes desde que estejam de posse da sabedoria. Se assim é, porque é que se não colocam estes como intermediários entre os homens miseráveis e os felizes imortais, pois têm de comum com os imortais felizes a felicidade e com os mortais miseráveis a mortalidade? Com certeza que, se são felizes, a ninguém invejam (haverá realmente algo de mais miserável que a inveja?), e ajudam, na media que lhes é possível, os mortais infelizes a obterem a felicidade para que possam também ser imortais depois da morte e possam unir-se aos anjos imortais e felizes.


CAPÍTULO XV

O homem Jesus Cristo mediador entre Deus e os homens.

Mas, se, segundo a opinião mais aceitável e mais provável, todos os homens são necessariamente infelizes por serem mortais, tem que se procurar um intermediário que seja, além de homem, também Deus — para, por mediação da sua bem-aventurada imortalidade, encaminhar os ho­mens da sua miserável mortalidade à imortalidade bem-aventurada. Era necessário que nem fosse excluído da mortalidade nem constrangido a permanecer mortal. Tornou-se, de facto, mortal, não por enfraquecimento da di­vindade do Verbo, mas por assunção da fraqueza da carne. Mas não permaneceu mortal na carne, que Ele res­suscitou dos mortos. O fruto da sua mediação é precisamente este: que aqueles para cuja libertação se fez mediador não permaneçam mais na morte perpétua da carne. Foi, pois, necessário que o mediador entre Deus e nós possuísse uma mortalidade transitória e uma felicidade permanente, para se poder acomodar aos mortais no passageiro e levá-los de entre os m ortos ao que permanece.

Os anjos bons não podem, portanto, ocupar uma posição intermediária entre os infelizes mortais e os imortais bem-aventurados, porque eles próprios são bem-aventurados (felizes) e imortais. Podê-lo-iam ser os anjos maus, porque, com o os mortais, são infelizes, e imortais como os bem-aventurados. Contrário a eles está o bom mediador que, contra a imortalidade e desgraça dos anjos maus, quis tornar-se mortal por algum tempo e pôde permanecer bem-aventurado na eternidade. Assim, para impedir que os maus anjos, imortais orgulhosos e infelizes
criminosos, seduzissem os homens, valendo-se da sua imortalidade para os conduzir à infelicidade, — o bom mediador, pela humildade da sua morte e a suavidade da sua beatitude destruiu o domínio daqueles nos corações que pela fé purificou da sua imundíssima tirania.

Assim, o homem mortal e infeliz, muito afastado dos seres imortais e felizes, que mediador poderá escolher que o conduza à imortalidade e à beatitude? O que poderia deleitá-lo na imortalidade dos demónios, é miséria; o que poderia chocá-lo na mortalidade de Cristo, já não existe. Naquele caso, tem que se precaver contra a desgraça sem fim, — neste caso, já não tem que temer a morte que não pôde ser eterna, mas amar a felicidade sempiterna. Se se interpusesse um mediador imortal e infeliz, seria para fechar a passagem à imortalidade feliz, porque o que impede de lá chegar — a própria infelicidade — persiste sempre. Mas, ao contrário, o que era mortal e feliz interpôs-se, uma vez passada a mortalidade, para dar aos que morreram a imortalidade — o que ele mostrou em si próprio ressuscitando e conferindo aos que são infelizes a beatitude de que jamais foi privado.

Há, pois, um mediador mau que separa os amigos — e há um mediador bom que congraça os inimigos. São muitos os mediadores que separam, porque, se a multidão dos anjos bons tira a sua beatitude da participação no Deus único, a desgraçada multidão dos anjos maus, privada desta participação, faz oposição mais para impedir do que para facilitar a nossa felicidade. A sua própria multidão de certo modo nos ensurdece com a sua vozearia, para nos tornar impossível o acesso ao bem único e beatificante. Para o conseguirmos, não são precisos mui­tos mediadores: basta um — precisamente aquele cuja participação nos torna felizes, o Verbo de Deus incriado, por quem tudo foi criado.  Todavia, não é enquanto Verbo que ele é mediador, porque o Verbo, soberanamente imortal e soberanamente feliz, está longe dos mortais infelizes. Ele é mediador enquanto homem, mostrando por isso mesmo que, para atingir aquele que é, não somente o Bem feliz (beatum) mas também beatificante (beatificum) não é preciso procurar outros mediadores que julguemos encarregados de dispor os degraus da nossa ascensão — pois foi o próprio Deus bem-aventurado (beatus) beatificante (beatificus), tor­nado partícipe da nossa humanidade, quem nos forneceu um meio rápido de participarmos na sua divindade. Real­mente, ao libertar-nos da mortalidade e da miséria, não foi para os anjos imortais e felizes que nos encaminhou, para nos alcançar uma felicidade e uma imortalidade deles recebida: foi sim para aquela Trindade cuja participação faz a felicidade dos próprios anjos. Por isso, quando quis, para ser mediador, pôs-se abaixo dos anjos na forma de escravo, manteve-se acima deles na sua forma de Deus, fazendo-se caminho de vida entre os inferiores, Ele mesmo que é a vida entre os superiores.


CAPÍTULO XVI

Terão os platónicos caracterizado acertadamente os deuses celestes quando afirmam que, para evitarem o contacto terreno, eles se não misturam com os homens, os quais, por sua vez, para conseguirem a sua amizade, precisam da ajuda dos demónios?

Não é verdade o dito que o mesmo platónico atribui a Platão:

Nenhum deus se mistura com os homens
[i] .

A melhor prova da sublimidade dos deuses, acrescenta ele, é que se não maculam em qualquer contacto com os homens. Reconhece, portanto, que os demónios estão maculados — e, por isso, não podem purificar aqueles que os poluem, e todos se tornam igualmente impu­ros: os demónios pelo contacto com os homens, os homens pelo
culto dos demónios. Ou então, se os demónios podem contactar e misturar-se com os homens sem se mancharem, é porque são melhores que os deuses, que se manchariam se se misturassem aos homens. Realmente, é privilégio dos deuses, diz-se, estarem de tal modo separados pela sublimidade que o contacto hum ano os não poderá macular.

Quanto ao Deus supremo, de tudo criador, a quem chamamos o Deus verdadeiro, diz Apuleio que, segundo Platão, é o único que não pode, por penúria da palavra humana, ser convenientemente compreendido pela linguagem; só no sábio, quando por sua força de alma, se despoja, tanto quanto possí­vel, do corpo humano, se torna transparente a com preensão deste Deus — e mesmo isto só por vezes, com o um fulgurante relâmpago em trevas profundas. Se, portanto, o Deus verdadeiramente superior a todas as coisas, nem por isso deixa de estar presente, embora só por vezes e no brilho fulgurante dum rápido
relâmpago, duma maneira inteligível e inefável à inteligência dos sá­bios quando eles tanto quanto possível se desprendem do corpo, sem já serem para Deus uma ocasião de contaminação — para que pôr os deuses pagãos tão longe nas alturas, com medo de que o contacto humano os macule? Como se não fosse suficiente ver esses corpos etéreos cuja luz ilumina, tanto quanto basta, a Terra! Se, na verdade, os astros, de que Apuleio faz outros tantos deuses visíveis, não são poluídos por quem os vê, também os demónios o não serão pelos olhares dos homens, mesmo que estes os vejam de perto.

Por acaso será que os deuses, que não podem ser manchados pela vista, poderão sê-lo pela voz dos homens — e por isso se teriam valido da intervenção dos demónios para receberem deles as palavras humanas, de que se conservam afas­tados para se manterem totalmente puros? Que direi, então, dos outros sentidos? Não é cheirando que quer os deuses quer os demónios, quando estão presentes, podem ser contaminados pelas exalações dos corpos vivos dos homens — pois que não o são durante os sacrifícios pela pestilência dos cadáveres. Quanto ao gosto — nenhuma necessidade os obriga a restabelecer a sua mortalidade, para que, movidos pela fome, peçam
alimentos aos homens. O tacto está à sua disposição, porque, embora pareça que o contacto se relaciona principalmente com o tacto, os deu­ses poderiam muito bem, se quisessem, misturar-se com os homens de m aneira a verem e a serem vistos, a ouvirem e a serem ouvidos. Que necessidade têm eles de tocar? Os próprios homens não se atreveriam a desejar tal dom desde que gozassem da vista ou do convívio dos deuses ou dos demónios bons. E, se a sua curiosidade chegasse ao ponto de o desejarem — como poderia um homem tocar num deus ou num demónio contra a vontade deles, se nem num pardal poderá tocar sem o apanhar?

Os deuses poderiam, portanto, misturar-se corporalmente com os homens, vendo-os e oferecendo-se à sua vista, falando-lhes e ouvindo-os. Mas, se os demónios, como disse, deste modo se misturam aos homens sem por isso se mancharem, ao passo que os deuses se mancham por esse contacto, então os demónios, no seu entender,
não podem ser manchados, mas podem-no os deuses. Mas,
se os próprios demónios se maculam, que auxílio podem eles prestar aos homens para lhes obterem a vida bem-aventurada depois da morte? Estando maculados, não podem purificá-los para os reunirem, uma vez purificados, aos deuses sem mácula, junto dos quais foram constituídos mediadores dos homens. E, se não prestam este serviço para que serve aos homens a amistosa mediação dos demó­nios? Será porventura para que, depois da morte, os homens não passem a deuses por intervenção dos demónios, mas vivam uns e outros contaminados e, portanto, nem uns nem outros felizes? A não ser que alguém o explique dizendo que os demónios, à laia de esponjas ou
coisa parecida, limpam os seus amigos, ficando eles tanto mais sórdidos quanto mais os homens ficam asseados por esta espécie de limpeza. Se assim é, os deuses misturam-se com os demónios mais contaminados, ao passo que, para não serem contaminados, evitam a vizinhança e o contacto dos ho­mens. Ou será que os deuses podem purificar os demónios contaminados pelos homens, sem por eles
serem contaminados, e não podem do mesmo modo purificar os ho­mens? Quem senão um enganado pelos falacíssimos demónios poderá pensar desta maneira? Se alguém fica manchado por ver e por ser visto — porque é que os deuses visíveis (como diz Apuleio)
essas brilhantes luzes do mundo [ii]
e com eles, todos os outros astros, estão expostos aos olhares dos homens, ao passo que os demónios, que só serão vistos se quiserem, estão livres deste contágio dos homens? E, se não é o facto de ser visto, mas o de ver que contamina, — então, terão que negar que

essas brilhantes luzes do mundo
[iii]

de que fizeram deuses, vêem os homens quando dardejam os seus raios sobre a Terra! Estes raios, que se difundem sobre tantos objectos imundos, não se contaminam, — e contaminam-se os deuses, se se misturarem com os homens, mesmo que necessário seja o contacto para aos homens socorrerem? O facto é que, tocada pelos raios do
Sol e da Lua, a Terra não contamina a sua luz.


(cont)

(Revisão da versão portuguesa por ama)





[i] Ibid.
[ii] Apuleio, De Deo Socratis, II, p. 8, ed. Thomas.
Ver Vergílio, Georg. I, 5-6
[iii] Apuleio, De Deo Socratis, II, p. 8, ed. Thomas.
Ver Vergílio, Georg. I, 5-6

Reflectindo - 233

Juízo

Sonhei com a minha morte e, de certa forma bizarra, percebi que estava a ficar preocupado com algo que, sei, vai acontecer: o ‘interrogatório’ que o Senhor me fará!

O que vou responder? Como vou responder?

Penso que poderia usar um pequeno (grande) ‘truque’ e usar as palavras de Pedro: «Tu, Senhor, Tu sabes tudo! Porque me interrogas?»

Mas, talvez, Ele vá insistir em obter respostas concretas.

Tenho ali, a meu lado, o meu Anjo da Guarda e olho para ele num apelo mudo e um pouco aflito.
Inclina-se sobre o meu ombro e segreda-me: “Ne timeas…” responde…»

Assim, de repente, penso que isso é bem fácil de dizer, mais a mais a um Anjo: Não temas! Grande coisa!!!
Não tive tempo de lhe explicar que não tenho medo, sim… na verdade, não tenho medo!
Tenho a convicção absoluta que este chamamento final, derradeiro, do Senhor se deve à Sua Misericórdia. Muito provavelmente terá decidido fazê-lo pensando:

“Chamemos este desgraçado antes que faça mais disparates!!!”

Ou seja… provavelmente não estava ‘pronto’, quero dizer, não tinha tudo em ordem, arrumado, muito certinho… seria só chegar ali e mostrar, abrir o livro e… pronto…
Mas… não! O livro é Ele Quem o tem nas Suas mãos. Tem setenta e tal páginas escritas em letra bem nítida e compreensível. Consigo ver muitos pontos de exclamação e, isto, preocupa-me um pouco porque não sei se se devem a uma apreciação positiva ou negativa.

Depois vejo a Senhora!
Radiante, linda, sereníssima.

Tem um enorme marcador verde na mão direita e, debruçando-se sobre o livro começa a sublinhar frases inteiras, às vezes, períodos extensos.

Fico fascinado e expectante enquanto a Senhora, tranquilamente, vai passando página após página sempre sublinhando, sem qualquer hesitação palavras após palavras.

De soslaio olho para o meu Anjo que me sorri de volta: “Ne timeas…”

O Filho não diz nada, observa atentamente a ‘tarefa’ da Sua Mãe. Parece-me que já está habituado a estas coisas e, espera, pacientemente, até que, nas Suas mãos, fica um livro cheio de marcas verdes. Uma coisa inacreditável!

Fico, também, calado, pois que hei-de eu dizer?

Finalmente, este maravilhoso interregno, acaba e, eu, fico à espera do tal ‘interrogatório’.

Mas… O Senhor, não diz nada. Fecha o livro e entrega-o ao meu Anjo para que o guarde na grande Estante dos Livros da Vida dos Homens.

Olha para mim uns brevíssimos momentos como se uma pequena hesitação o assaltasse mas, logo de imediato, estende-me a Sua Mão e diz-me simplesmente:

“Vem!”


(ama, reflexões, 2013.06.25)

Renova a alegria de lutar

Em certos momentos angustia-te um princípio de desânimo, que mata todo o teu entusiasmo, e que mal consegues vencer à força de actos de esperança. Não importa; é a melhor hora de pedir mais graça a Deus, e avante! Renova a alegria de lutar, ainda que percas uma escaramuça. (Sulco, 77)


Com monótona cadência sai da boca de muitos o ritornello já tão vulgar, de que a esperança é a última coisa que se perde; como se a esperança fosse um apoio para continuarmos a deambular sem complicações, sem inquietações de consciência; ou como se fosse um expediente que permite adiar sine die a oportuna rectificação do procedimento, a luta para alcançar metas nobres e, sobretudo, o fim supremo de nos unirmos com Deus.



Eu diria que esse é o caminho para confundir a esperança com a comodidade. No fundo, não há ânsias de conseguir um verdadeiro bem, nem espiritual, nem material legítimo; a mais alta pretensão de alguns reduz-se a evitar o que poderia alterar a tranquilidade – aparente – de uma existência medíocre. Com uma alma tímida, acanhada, preguiçosa, a criatura enche-se de egoísmos subtis e conforma-se com o facto de os dias, os anos decorrerem sine spe nec metu, sem aspirações que exijam esforço, sem os perigos da peleja: o que importa é evitar o risco do desaire e das lágrimas. Que longe se está de obter uma coisa, se se malogrou o desejo de a possuir, por temor das exigências que a sua conquista comporta! (Amigos de Deus, n. 207)

Pequena agenda do cristão

Sexta-Feira


(Coisas muito simples, curtas, objectivas)




Propósito:

Contenção; alguma privação; ser humilde.


Senhor: Ajuda-me a ser contido, a privar-me de algo por pouco que seja, a ser humilde. Sou formado por este barro duro e seco que é o meu carácter, mas não Te importes, Senhor, não Te importes com este barro que não vale nada. Parte-o, esfrangalha-o nas Tuas mãos amorosas e, estou certo, daí sairá algo que se possa - que Tu possas - aproveitar. Não dês importância à minha prosápia, à minha vaidade, ao meu desejo incontido de protagonismo e evidência. Não sei nada, não posso nada, não tenho nada, não valho nada, não sou absolutamente nada.

Lembrar-me:
Filiação divina.

Ser Teu filho Senhor! De tal modo desejo que esta realidade tome posse de mim, que me entrego totalmente nas Tuas mãos amorosas de Pai misericordioso, e embora não saiba bem para que me queres, para que queres como filho a alguém como eu, entrego-me confiante que me conheces profundamente, com todos os meus defeitos e pequenas virtudes e é assim, e não de outro modo, que me queres ao pé de Ti. Não me afastes, Senhor. Eu sei que Tu não me afastarás nunca. Peço-Te que não permitas que alguma vez, nem por breves instantes, seja eu a afastar-me de Ti.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?